MOSTRA SP: “FILHO DE BOI”, A ARTE COMO FUGA.

Por Celso Sabadin.

Cinco anos atrás eu havia ficado muito impressionado – positivamente – com o documentário “Jonas e o Circo sem Lona”, para mim, o melhor filme brasileiro de seu gênero em 2015. Agora, os mesmos realizadores do documentário voltam ao tema, desta vez como ficção. E novamente com excelentes resultados.

Com direção de Haroldo Borges e realização do coletivo baiano Plano 3 Filmes (formado por Paula Gomes, Haroldo Borges, Ernesto Molinero e Marcos Bautista), “Filho de Boi” fala do garoto João (vivido por João Pedro Dias, ótimo), um pastor de cabras em algum lugar perdido na vastidão do interior da Bahia. O árido cotidiano de João ganha luzes e cores com a chegada na cidadezinha do Circo Papaléguas, que logo se apresenta como uma possibilidade para o menino sair do universo de sua mesmice e ganhar o mundo. Ou, pelo menos, a Bahia.

“Filho de Boi” conquista pela simplicidade e pela qualidade. Dentro de um registro extremamente realista, e com excelente fotografia, o longa aborda questões como preconceitos, ignorância e a sempre discutida maldade intrínseca que acompanha o ser humano desde as mais tenras idades.

A espontaneidade da criação artística – representada pela autenticidade mambembe do circo – simboliza no filme a fuga para um sonhado mundo melhor onde prevaleceriam laços familiares escolhidos, e não impostos. Além, claro, da alegria das maquiagens brancas e narizes vermelhos que nos tiram do mundo real e nos levam – nem que seja por alguns minutos – para o plano superior que só a arte pode proporcionar.

“Filho de Boi é um filme sobre raízes, que lança luz sobre as relações no sertão, esse território que normalmente é reconhecido como um lugar de fuga. Mas ficar, às vezes, exige mais coragem do que partir”, diz Haroldo Borges.

O elenco traz Jonas Laborda (de “Jonas e o Circo sem Lona”), atores profissionais como Luiz Carlos Vasconcelos e Vinicius Bustani, revelação do teatro baiano, vários palhaços de pequenos circos itinerantes da Bahia, que no filme, não interpretam personagens que são palhaços, além de atores naturais. “O trabalho com os atores foi uma verdadeira maratona. João, o protagonista, foi o último candidato que conhecemos dos 1.500 meninos que entrevistamos durante a pesquisa; todos de escolas públicas; todos do sertão. Começamos procurando por um perfil específico que tínhamos no roteiro. Mas ao ir conhecendo esses meninos, resolvemos nos deixar levar por suas histórias. Até que conhecemos João. Tímido, falando baixinho. Um menino de alma entranhada! O mais improvável para viver um protagonista. Mas foi essa improbabilidade que nos cativou”, complementa o diretor.

“Filho de Boi” tem exibição na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo que começa nesta quinta-feira (22/10) em edição online. Os títulos serão exibidos em três plataformas (a Mostra Play, o Sesc Digital e a Spcine Play) e em dois cinemas ao ar livre na cidade de São Paulo: o Belas Artes Drive-In e o CineSesc Drive-in. A programação completa da 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo está em https://44.mostra.org