A DOR SOLITÁRIA DE “VERGEL”.

Por Celso Sabadin.   

Há várias formas de prisões. Há várias formas de purgatório.  Uma bela mulher (Camila Morgado, perfeita), de olhos perdidos e gestos desesperados, está presa em seu próprio purgatório particular: um apartamento. Arejado, ensolarado, bonito, repleto de plantas, mas nada que consiga iluminar sua alma perturbada, que flutua dolorosamente pelo abismo da perda. Sem nome, a mulher acaba de perder o marido, mas ainda não tem tempo para chorar: antes, ela precisa desembaraçar o inferno da burocracia para liberar o corpo.

O microcosmos do apartamento simboliza esta recém-viúva encerrada em sua própria imobilidade. De alguma forma, ela precisa enterrar o marido para deixar a dor emergir e – após expiá-la – seguir em frente. Ou pelo menos começar a tentar.

“Vergel” nos convida a compartilhar o sofrimento desta mulher sem nome em seu caminho dantesco. Veremos o que ela vê, saberemos o que ela sabe, receberemos as visitas que ela recebe, ouviremos os telefonemas que ela ouve. E – graças a uma ótima direção – sentiremos o que ela sente. Nenhum outro ponto de vista importa, a não ser o dela. Nenhuma outra dor importa, a não ser a dela.

Coproduzido por Argentina e Brasil, “Vergel” marca uma mais do que promissora estreia em filmes de ficção da ex-atriz performática porteña Kris Niklison. Foi ela quem caprichosamente, durante sete anos, idealizou o projeto, criou o argumento, roteirizou, dirigiu, fotografou, desenvolveu o story-board, operou a câmera e coordenou a montagem do longa. Um capricho que se vê em cada plano, em cada fonte de luz, em cada tempo da edição, em cada interpretação (mesmo as que surgem apenas via telefone).

O resultado é um convite à reflexão sobre a dor da perda, ou como afirma a própria cineasta “uma tentativa de entender a morte. Minha morte, outras mortes, as mortes internas às quais nos levam o desaparecimento físico de um ser querido. E querer entender a morte me levou à complexa tarefa de tentar entender a vida. A vida, que pode ser um simples nascer, respirar, desenvolver-se, procriar, evoluir e morrer”.

A estreia é em 7 de fevereiro.