“A FEBRE”, O GRITO MUDO DOS POVOS ORIGINÁRIOS.

Por Celso Sabadin.

Justino (Regis Myrupu) parece doente. Anda febril e desanimado. Talvez seja consequência da tristeza que sofre antecipadamente por saber que sua filha Vanessa (Rosa Peixoto) se mudará para Brasília, para estudar. Talvez seja a pressão do trabalho emburrecedor que divide com um colega toscamente preconceituoso. Talvez seja o medo inconsciente de um animal misterioso que ele vê rondando sua casa… ou acha que vê em seus sonhos. Talvez.

Mas o fato é que Justino parece doente. E padece de uma febre causada pelo intransponível abismo cultural que separa a sua autêntica ancestralidade originária, da artificialidade urbana predatória em que mergulhou.

Com direção de Maya Da-Rin (estreando no longa ficcional) e roteiro da própria diretora em parceria com Miguel Seabra Lopes e Pedro Cesarino, “A Febre” estreia neste 12 de novembro com a chancela de ser um dos melhores filmes brasileiros deste estranhíssimo ano de 2020.

O roteiro é enxuto e amarrado, a direção é de grande sensibilidade, as intepretações se encaixam perfeitamente no registro naturalista coerente com o tema, e todo o conjunto é de um extremamente bem-vindo minimalismo que serve com perfeição à proposta humanista da obra.

Não por acaso, “A Febre” já foi selecionado para mais de 60 festivais, conquistando 32 prêmios, entre eles o Leopardo de Ouro de Melhor Ator e Prêmio da Crítica Internacional FIPRESCI no Festival de Locarno, cinco Candangos no 52º Festival de Brasília, além de premiações em festivais na França, China, Argentina, Portugal, EUA, Uruguai, Chile, Peru, Alemanha e Espanha.

Coproduzido por Brasil, França e Alemanha, o filme se reveste de importância ainda maior, neste momento de ataques econômico, financeiro e cultural que o Governo Federal impõe às populações originárias.