A IRONIA CORROSIVA E BEM HUMORADA DE “ANIMAL POLÍTICO”.

Por Celso Sabadin.

O protagonista – sem nome – do filme “Animal Político”, assim como muitos jovens de sua idade, acredita ter uma vida perfeita. Afinal, ele joga vôlei, frequenta baladas, vai ao cabeleireiro, tem uma família que o ama e em caso de baixo astral sempre dá uma passada no shopping para melhorar o ânimo. Até o dia em que o vazio da existência se mostra maior que as “perfeições” de sua vida, e o protagonista se sente impelido a procurar novos caminhos em busca de sua realização.

O recorrente tema do sentido da vida é tratado aqui com muito sarcasmo e bom humor pelo diretor e roteirista pernambucano que se assina simplesmente como Tião. Premiado na Quinzena dos Realizadores em Cannes pelos curtas “Muro“ (008) e “Sem Coração“ (2014), Tião estreia agora no longa demonstrando vigor, criatividade, talento e segurança na direção.

O filme atira para todos os lados aos construir (ou desconstruir?)  o patético universo consumista/capitalista em que se insere. As referências culturais do protagonista sem nome são coloniais, com canções natalinas interpretadas  em inglês, música country, e até uma “infância feliz” vivida na neve. Em Recife. Quando de sua peregrinação pelo deserto, no melhor estilo bíblico, ele se depara tanto com seus antepassados kubrickianos  conhecidos por “2001 – Uma Odisseia no Espaço”, quanto com seu futuro ditado por um oráculo mecânico que lhe desafia: “Me pergunte qualquer coisa que eu respondo superficialmente”.  Um caldeirão de referências da cultura pop somado a divertidas pérolas de autoajuda  embalam este protagonista naquilo que ele mesmo define como “a busca pela totalidade da compreensão, e logo pela compreensão da totalidade”. Cabe até um momento em que referencia a famosa cena da reunião de condomínio do filme “O Som ao Redor”.

E ainda há tempo e espaço para a inserção da Pequena Caucasiana, outra divertida personagem, que se define como “herdeira da indústria escravista da cana de açúcar, e filha de holding internacional”. Ruiva de olhos claros, a Pequena Caucasiana entra e sai da trama pipocando em ruídos e “defeitos” de filmagem, mimetizando uma estética cinematográfica que homenageia o Cinema Marginal brasileiro dos anos 60, uma época de muita transgressão à rigidez das normas estabelecidas e à caretice das fórmulas importadas.  Normas, aliás, que Tião faz questão de ironizar com muito bom humor neste seu “Animal Político”.

Não por acaso, o tal protagonista sem nome é finalmente diagnosticado pelas modernas técnicas da medicina contemporânea como “grave”. O motivo? Há em seu cérebro, ameaçador e inoperável, aquilo que o médico lhe diz ser “um pequeno pensamento que você teve, incomodou, e cristalizou”.

“Animal Político” ganhou o prêmio especial do Júri do Festival Internacional du Film Indépendent de Bordeaux França), o prêmio revelação no festival luso-brasileiro de Santa Maria da Feira (Portugal)., tendo participado também dos festivais de Rotterdam, Torino e Durban, entre outros. Estreou na quinta, 8 de junho.