A JUVENTUDE, NEM TÃO REBELDE ASSIM, DE “OS PAQUERAS”

Por Celso Sabadin.

Em 1960, Federico Fellini já havia encantado o mundo com seu “A Doce Vida”. Um ano depois, foi a vez de Blake Edwards maravilhar as plateias com “Bonequinha de Luxo”. O que estes filmes – realizados num espaço de tempo tão curto – teriam em comum? Ambos foram hábeis em captar os caminhos muitos particulares daquela juventude “sem causa” que emergia nos anos 1960. Daqueles milhares de moças e rapazes nascidos logo após a Segunda Guerra e que enxergavam um mundo tedioso e sem perspectivas. Uma geração que herdara de seus pais um planeta abalado por duas bombas atômicas e dezenas de milhões de mortos em combate. Uma juventude nihilista, desalentada e contemplativa que colocava a diversão e a auto-satisfação acima de tudo.

Guardadas as devidas proporções –  e põe proporções nisso – o cinema brasileiro também fez, na medida do possível, o seu “A Doce Vida”. Nove anos depois do clássico de Fellini (as coisas por aqui sempre foram meio devagar), Roberto Farias produziu e seu irmão Reginaldo Faria dirigiu “Os Paqueras”, a partir de um argumento do próprio Reginaldo em parceria com Xavier de Oliveira e André José Adler.

O papel principal também é de Reginaldo Faria, que interpreta Nonô, rapaz de 25 anos que age como se tivesse 15. Irresponsável, sustentado pelo pai (o veterano Fregolente) e sem a menor intenção de procurar trabalho ou estudo, Nonô só se preocupa em transar com toda e qualquer mulher bonita que cruze seu caminho. Desde que ela não seja solteira e desimpedida, pois isso poderia significar algum tipo de compromisso, palavra que o rapaz detesta com todas as forças.

É flagrante também o machismo de um roteiro que passa a impressão que, naquele Rio de Janeiro de 1969, toda e qualquer mulher está claramente disposta a trair seu marido e mergulhar nos encantos dos belos olhos azuis do protagonista. A qualquer momento.

Em seus jogos diários de sedução, Nonô conta com a ajuda do experiente amigo Toledo (o eterno galã Walter Forster) homem de meia idade, financeiramente saudável, cujo comportamento não difere muito do jovem colega de conquistas. Não por acaso, “Você já viu o filme A Doce Vida?” é uma das cantadas preferidas de Nonô.

Grande parte de “Os Paqueras” é dedicada às molecagens  de Nonô e Toledo, destilando doses daquele humor ao mesmo tempo picante e ingênuo, salpicado com alguma nudez, que caracterizavam as chamadas “pornochanchadas” da época, que de “ponô” nada tinham.

Embora predomine o sentimento de revolta muda e tediosa contra as estruturas apodrecidas de um sistema social falido que a nova geração se recusa a compactuar, o terço final do filme se encaminha – como geralmente acontecia nas pornochanchadas da época – para uma mensagem conservadora onde prevalecerão os mesmos valores da geração anterior. Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais, como Belchior diria em 1976.

 

Com rápidas participações especiais de Leila Diniz e Milton Gonçalves, interpretando a si mesmos, “Os Paqueras” mostra um Reginaldo Farias com ótima desenvoltura nos momentos cômicos de seu papel. Há ainda uma marcante participação especial de Natália do Valle, não creditada. Um interessante retrato de uma época muito particular.