“A MULHER SEM CHÃO”, “OS DRAGÕES” E A RIQUEZA DOS SOTAQUES DOS BRASIS.

Por Celso Sabadin.

No instante em que se comemora a mais que expressiva premiação de “O Agente Secreto” em Cannes, nosso circuito exibidor oferece várias opções de produções brasileiras, desfilando toda a nossa diversidade, nos mais diferentes sotaques.

 

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A MULHER SEM CHÃO

O abismo sociocultural entre a ancestralidade indígena e a urbanização descontrolada é o tema básico de “A Mulher Sem Chão”, longa dirigido por Auritha Tabajara e Débora McDowell. O filme é construído dentro de um interessante e atrativo hibridismo entre ficção e documentário, no qual é mostrada a trajetória da própria codiretora Auritha, que desta forma também se insere como protagonista, digamos, “interpretando a si mesma”.

Nascida em comunidade indígena cearense, Auritha e sua filha adolescente mudam-se para São Paulo, onde tomam contato com culturas e vivências diametralmente opostas às que conheciam em sua terra natal. Entre os maiores méritos do filme está a maneira fluida e descontraída como os conflitos se desenrolam, evitando a linguagem panfletária que não raro contaminam os discursos sobre este tema. Tal fluidez cria uma forte empatia entre a protagonista e o público, potencializando a intensidade do alcance da obra, ao mesmo tempo em que descobre na presença da adolescente um fiel de balança perfeito para a busca de um equilíbrio entre os dois mundos.

Sotaques nordestinos, indígenas e paulistanos se fundem inexoravelmente no caldeirão cultural da metrópole. O filme estreia em cinemas de Manaus, Salvador e São Paulo.

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OS DRAGÕES

Já do sul do país vem “Os Dragões”, longa ficcional direcionado para o público juvenil.

O filme é inspirado em vários contos do escritor mineiro Murilo Rubião (1916 – 1991), um precursor do realismo fantástico no Brasil, com roteiro de Gibran Dipp e do diretor do longa, Gustavo Spolidoro, ambos gaúchos.

 

A ação se passa em alguma cidadezinha reacionária e conservadora do Rio Grande do Sul (não deve ter sido difícil encontrar), dominada pelos desmandos do padre local, que entra em conflito direto com um grupo de jovens em processo de mutação. Aplique-se aqui à palavra “mutação” o seu sentido mais amplo, seja o da transição da adolescência para o mundo adulto, a tomada de consciência das limitações de suas origens, ou mesmo a representação simbólica dos milenares contos infanto-juvenis.

 

De qualquer forma, o importante é perceber que chega um momento da vida em que é necessário romper as amarras tradicionais e botar fogo pelas ventas em desafio ao atraso do conservadorismo. Até literalmente, se preciso for.

 

Aqui, o sotaque é fortemente gaúcho, com intercorrências do dialeto vêneto.

 

Com clara inspiração nos filmes adolescentes estadunidenses dos anos 1980, “Os Dragões” segue um percurso diferenciado em sua estratégia de distribuição. A estreia nacional, dia 22 de maio, aconteceu exclusivamente no Rio Grande do Sul, como forma de valorizar e incentivar a produção audiovisual local. Das 37 cidades do estado que possuem salas de cinema, 11 já estão confirmadas na estreia: Bento Gonçalves, Cachoeira do Sul, Cachoeirinha, Canela, Caxias do Sul, Gravataí, Lajeado, Passo Fundo, Pelotas, Porto Alegre e Santa Maria.

 

Posteriormente, o filme seguirá para os demais estados. Há também ações voltadas a alunos do 7º ao 9º ano do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, nas quais o projeto promove sessões em cinemas parceiros, com ingressos acessíveis e material de apoio para professores, possibilitando que o conteúdo do filme seja debatido em sala de aula e conectado aos temas do currículo.