A POESIA DAS PERCEPÇÕES NO ENCANTADOR “ESPLENDOR”.

Por Celso Sabadin.

A rara (e põe rara nisso) sensibilidade do cinema japonês é ratificada em “Esplendor”, belíssimo drama escrito e dirigido por Naomi Kawasi, a mesma de “O Sabor da Vida” e “O Segredo das Águas”.

“Esplendor” acompanha Misako (Ayame Misaki, ótima), uma jovem de profissão muito especial: redigir textos para audiodescrições, ou seja, narrações que descrevem filmes para que deficientes visuais possam frequentar os cinemas. Cabe a ela assistir aos filmes, captar suas essências e sentimentos, e traduzir tudo em palavras que – via aparelhos auditivos – serão transmitidas ao público portador de deficiências visuais. Além de criar os textos, Misako também os submete à aprovação de um grupo de cegos, que a orientam em sua difícil tarefa.

Abre-se a partir daí um complexo portal de sensações e percepções magnificamente explorado no filme de Kawasi. Cada indivíduo – deficiente visual ou não – tem seus próprios repertórios de interpretações, seus próprios ferramentais de sensibilidades, e a sua própria maneira de lidar com o outro. A cegueira, aqui, entra como metáfora.

Misako se vê obrigada a se transportar para o universo dos cegos para desenvolver sua vida profissional, ao mesmo tempo em que precisa lidar com a doença degenerativa da mãe para lidar com sua vida pessoal. Uma situação que assume contornos mais perturbadores quando ela entra em rota de colisão com Nakamori (Masatoshi Nagase), um fotógrafo que não consegue lidar com o desespero de estar perdendo a visão.

É nesta fervura emotiva (sempre abafada pelo tradicional represamento das ações exacerbadas, tão típico da cultura oriental) que “Esplendor” destila seus vários níveis de sensibilidade. À flor da pele, o filme brinda o público com silêncios reveladores e super closes que quase devoram os protagonistas. Com maestria, a diretora nos joga neste rico universo de diversidade de percepções e sua amplidão de temores, paixões e solidões.

Vencedor do Prêmio Ecumênico no Festival de Cannes, “Esplendor” estreia em 10 de maio, já como forte candidato a um dos melhores filmes do ano.