“A SNIPER RUSSA” NÃO MATA HOMENS. APENAS FASCISTAS.

Por Celso Sabadin.

Não é nem um pouco à toa que uma das marcas do cinema deste nosso século é a explosão dos documentários e dos filmes baseados em casos reais: são tantas as inacreditáveis histórias verdadeiras a serem contadas pelos filmes que os criadores de roteiros originais estão de cabelos em pé, tentando desenvolver tramas mais criativas que as fornecidas pela vida. E sem sucesso.

Uma destas mais recentes e surpreendentes histórias reais a chegar ao cinema é a de Lyudmila Pavlichenko (Yuliya Peresild, ótima), uma estudante russa que serviu como “sniper” (atiradora de elite) durante a Segunda Guerra Mundial. O fato do exército soviético recrutar mulheres para o campo de batalha nem é exatamente a grande questão do filme, já que o procedimento era comum por ali, ao contrário do que acontecia nas frentes estadunidenses e britânicas, bem mais machistas.
O ponto mais interessante desenvolvido pelo roteiro de Maksim Budarin, Max Dankevich Leonid Korin, Sergey Mokritskiy e Egor Olesov é a grande amizade que a jovem soviética desenvolve com Eleanor Roosevelt, a primeira dama dos Estados Unidos (vivida pela inglesa Joan Blackham, falecida em 2020), e como este relacionamento influenciou as relações bélico-político- diplomáticas entre as duas potências, na época unidas conta o nazismo e o fascismo.

Tudo começa quando, em uma cerimônia oficial, Eleanor Roosevelt pergunta a Lyudmilla quantos homens ela já havia matado nos campos de batalha. A garota responde, orgulhosa, “309”. A primeira dama se espanta com a quantidade e reforça: “Você matou 309 homens?”. Ao que a sniper responde: “Homens não; fascistas”.
A partir desta inevitável identificação, flashbacks reconstituem a trajetória de Lyudmilla, mostrando sua difícil relação com o pai militar, sua extrema habilidade de atiradora, e a forma como tanto soviéticos quanto norte-americanos se aproveitam da fama e do carisma da personagem para desenvolver suas campanhas político-publicitárias. O longa retrata também as hostilidades e o machismo que Lyudmilla sofre por parte da imprensa norte-americana.
Como não poderia deixar de ser, os inacreditáveis horrores da Guerra estão presentes, em cenas de grande força dramática e bom nível de produção. Principalmente os relacionados ao histórico cerco de Sebastopol, onde morreram mais de 100 mil russos. Inclusive, o título original do filme, que é uma coprodução Rússia/Ucrânia, é “O Cerco de Sebastopol”.

Histórias como estas são pouco ou quase nada conhecidas pelos povos subjugados pela cultura e pela política estadunidense (Brasil inclusive), pois sempre foram censuradas pelos donos do poder, temerosos que qualquer elogio à Rússia ou aos então soviéticos pudesse desencadear uma onda revolucionária pelo planeta. Até o clássico “Encouraçado Potemkim” foi proibido no Brasil pela ditadura empresarial-militar iniciada em 1964.

Mas, voltando ao filme, “A Sniper Russa” opta pela narrativa clássica/didática, e se mostra competente e eficaz no que se propõe. A direção é de Sergey Mokritskiy, o mesmo de “O Guardião dos Mundos”.
Colecionando mais de 20 indicações e premiações nacionais e internacionais, o longa chega nesta quinta-feira, 25/11, na plataforma www.cinemavirtual.com.br