“A TERRA E A SOMBRA” MOSTRA A FORÇA POÉTICA E POLÍTICA DO CINEMA LATINO.

Por Celso Sabadin.

Na zona rural de algum país sul-americano, uma família historicamente presa à terra sofre com as transformações do mundo atual. O chefe da casa, doente, não pode trabalhar, e as cinzas das queimadas ao seu redor só pioram ainda mais a sua saúde. Sua esposa sai então em busca do sustento da casa, e se depara com as péssimas condições de trabalho dos cortadores de cana que, ameaçados pela mecanização, submetem-se a tudo para não perder o trabalho. É neste cenário quase apocalíptico que o avô da família retorna à pequena propriedade, após longos anos de ausência. Afinal, alguém precisa ensinar o netinho a reconhecer e a imitar o canto dos pássaros.

Poeira, cinzas, queimadas e longos silêncios permeados por uma extrema aridez formam o arcabouço poético que o colombiano César Acevedo utiliza neste impactante “A Terra e a Sombra”. Logo em seu trabalho de estreia, Acevedo conquista com este seu filme o prestigiado prêmio Camera d’Or no Festival de Cannes, e com méritos. Amparado por uma belíssima fotografia (assinada por Mateo Guzmán, também estreante na função), o diretor e roteirista extrai da desolação um pungente drama familiar que fala de reencontros e redenções, sem deixar de lado o pano de fundo político, tão caro ao cinema latinoamericano.

Com exceção de Marleyda Soto, que interpreta a nora de Alfonso, os demais atores também são todos estreantes, e foram preparados pela brasileira Fátima Toledo. O Brasil também coproduz o filme, juntamente com França e Holanda, além da própria Colômbia.

A lamentar apenas que uma obra com tanto a dizer e tanto a mostrar seja lançada em meio a este recente turbilhão de estreias que vem engolindo e cuspindo bons filmes, desperdiçando grandes talentos, tudo em nome de um suposto mercado que ergue e destrói coisas belas. Perde o cinema, perdemos todos nós.