ALUCINADO, “O BEM AMADO” BUSCA O GRANDE PÚBLICO.

Haja ouvidos! É preciso ter uma boa dose de complacência auditiva para acompanhar, do começo ao fim, a comédia O Bem Amado, novo filme do diretor Guel Arraes, baseado na peça de Dias Gomes, que por sua vez originou o antigo sucesso da TV estrelado por Paulo Gracindo. Agora, o papel título, que era de Gracindo, é de Marco Nanini. E Zeca Diabo (antigamente, Lima Duarte) é José Wilker. A trama fala do corrupto prefeito da fictícia Sucupira, que desvia as verbas do município para viabilizar sua obra “faraônica”: a construção de um cemitério local. O campo santo é concretizado, mas, para deleite da oposição, ninguém morre na cidadezinha, tornando a obra um elefante branco. Odorico Paraguaçu, o “Bem Amado”, precisa urgentemente resolver esta situação.

O texto original de Dias Gomes – maravilhoso – poderia render um excelente filme, se bem adaptado para as telas. Porém, Guel Arraes (diretor também de O Auto da Compadecida), optou por transformá-lo numa espécie de Zorra Total em longa-metragem. Os personagens berram o tempo todo (gritar é pouco), o histrionismo corre solto, o ritmo é frenético (embora tudo se passe numa cidadezinha onde teoricamente nada acontece), tudo é exagerado, coloridíssimo, barulhentíssimo, histérico.

Há momentos de O Bem Amado em que os fatos se desenrolam em ritmo tão alucinado que a sensação é de estarmos assistindo a um trailer. Um gigantesco trailer de 107 minutos, no qual não há tempo para respiro ou reflexão. É como se um montador de cenas de ação de Hollywood tivesse sido contratado para editar a sutileza cômica e política de Dias Gomes. Algo assim como um elefante em uma loja de cristais.

Compreende-se, porém, a intenção de Guel Arraes. Em algum momento da história do cinema, alguém começou a vender a ideia de que quanto mais alucinógena for a edição de um filme, quanto menos o público tiver a oportunidade de respirar, mais comercial será este mesmo filme. Ou “produto”, como querem alguns. Em algum momento, alguém começou a vender a ideia de que, em Cinema, pensar é o mesmo que se aborrecer. E o estilo histérico-televisivo-sufocante começou também a contaminar a tela grande.

Guel, como diretor Global, visa ao sucesso. E a Globo Filmes, como empresa comercial, idem. Nada contra ganhar dinheiro. Mas se O Bem Amado vier a provar, em sua estreia, que o sucesso comercial passa necessariamente pela histeria narrativa, terei de ir correndo até a farmácia mais próxima para comprar algodão para os ouvidos (como, aliás, faz o personagem de Matheus Nachtergaele).

Como disse um anônimo na noite em que foi exibido no Cine PE 2010, “este deve ser o tal cinema de inclusão dos deficientes auditivos, que tanto falam”…