“AMORES DE CHUMBO” E AS ETERNAS SEQUELAS DA TRUCULÊNCIA.

Por Celso Sabadin.

Dizem os livros de História que a ditadura iniciada em 1964 no Brasil durou 21 anos. Não é, não. Ditadura é muito mais que um período histórico/político. Ditadura é um câncer social que, uma vez instalado, permanece corroendo o organismo lenta e indefinidamente, mesmo após a sua suposta extirpação. E deixa sequelas incuráveis.

Um dos resquícios deste período pode ser visto em “Amores de Chumbo”, primeiro longa da pernambucana Tuca Siqueira, que aqui também assina o roteiro.

Tudo começa na festa que comemora os 40 anos de casamento de Miguel (Aderbal Freire Filho) e Lúcia (Augusta Ferraz). A cena é bela e terna, e talvez até pelo delicioso sotaque recifense que a permeia, chega a lembrar a festa de aniversário que abre “Aquarius”.  Através de poucos e longos planos intimistas, logo se desvenda o conflito que será a espinha dorsal do filme:  Maria Eugênia (Juliana Carneiro da Cunha), antiga namorada de Miguel, está de volta, após um longo exílio que lhe foi imposto pelas forças da ditadura. O casamento aparentemente tão sólido de Miguel e Lúcia ameaça ruir.

“Amores de Chumbo” fala de sonhos desfeitos, juventudes perdidas e de mágoas escondidas nos fundos dos porões de cada coração. Mostra que não é apenas a morte que interrompe a vida, mas também a brutalidade, a ruptura que o poder truculento pode impor sobre toda uma geração. Ou duas, ou mais. Ainda que um pouco prejudicado por uma direção de atores nem sempre satisfatória, o filme tem o grande mérito de, sem nenhum tipo de panfletarismo superficial, alertar para as consequências arrasadoras e longevas de todo e qualquer regime ditatorial. Dure o tempo que for, privar um povo de sua liberdade é plantar a tristeza e a destruição com fortes e profundas raízes.

“Amores de Chumbo” estreia em 14 de junho.