AOS 84 ANOS, CLINT EASTWOOD ACERTA OUTRA VEZ COM “JERSEY BOYS”.

Qual será a magia de Clint Eastwood? Seu novo filme, “Jersey Boys”, que aqui no Brasil recebe o desnecessário subtítulo de “Em Busca da Música”, começa igualzinho a tantas outras cinebiografias de ídolos musicais, e vai se desenrolando igualzinho a tantas outras cinebiografias de ídolos musicais. As dificuldades do início de carreira, os desentendimentos com empresários, o sucesso, as brigas com as famílias… toda a cartilha das cinebiografias de ídolos musicais está lá, se repetindo, se repetindo.

E, de repente, como que num passe de mágica, estamos absolutamente submersos no filme, envolvidos pelos pequenos dramas e alegrias de cada um daqueles personagens, fascinados pela música e querendo que “Jersey Boys” não acabe nunca. Como Clint conseguiu novamente? Sem nenhum grande astro famoso, nem efeitos especiais mirabolantes, com as posições de câmera, enquadramentos e linha narrativa das mais clássicas possíveis, o diretor, aos 84 anos, faz outra vez um filme apaixonante.

Qual seria sua magia? Arrisco um palpite: a construção de personagens verossímeis, humanos, onde não há vilões nem heróis. Personagens críveis, ao mesmo tempo simples e profundos, que poderiam viver no apartamento de cima. E mais: sem penduricalhos. Clint Eastwood se concentra em contar bem uma história, o que faz aos limites da perfeição. Não passa o filme inteiro em busca de um grande momento revelador, e sabe, como poucos, utilizar um dos grandes elementos de ouro do cinema: o silêncio. Principalmente num filme repleto de música, como “Jersey Boys”, o diretor (que também é músico) sabe valorizar as canções do filme entremeando-as com magníficos silêncios. E outra: contribuindo ainda mais para a veracidade da trama, o que ouvimos na tela é de fato o canto dos atores no set, como se estivessem ao vivo, sem regravações e play-backs posteriores.

Como suporte, Clint utiliza-se de uma magnífica direção de arte que proporciona credibilidade total na reconstituição de época, e uma fotografia um pouco, digamos, lavada, como que ressaltando o clima de sonhos daqueles deliciosos anos 50 e 60.

A história, ah, sim, há uma história: a partir do sucesso homônimo dos palcos da Broadway, “Jersey Boys” conta a trajetória dos quatro jovens de Nova Jersey que, sob os auspícios da Máfia local, formam o grupo musical de grande sucesso
“The Four Seasons”. Como a peça está há mais de oito anos em cartaz, nada mais apropriado que reaproveitar, na tela, os atores do palco. John Lloyd Young reprisa seu papel vencedor do Tony Award, o do legendário vocalista do Frankie Valli; Erich Bergen interpreta Bob Gaudio, que escreveu ou coescreveu os maiores hits do grupo; Michael Lomenda e Vincent Piazza interpretam respectivamente Nick Massi e Tommy DeVito, dois membros originais da banda, enquanto o sempre ótimo Christopher Walken vive o mafioso Gyp DeCarlo.

Particularmente, minha grande única restrição ao filme é o recurso de utilizar os atores falando diretamente para a câmera, explicando didaticamente ao público algumas passagens que poderiam facilmente ser resolvidas apenas com a linguagem cinematográfica. É uma mera questão estilística, mas que contribui para “tirar” a plateia do clima do filme.

Mas de qualquer maneira “Jersey Boys” é uma deliciosa viagem musical. Sim, há um tom meio “chapa branca” no filme, o que nem poderia ser diferente, pois a o próprio Franke Valli é um dos produtores executivos. Releve e curta.