“AQUARIUS”, URGENTE E IMPRESCINDÍVEL

Por Celso Sabadin, de Gramado.

Assim como já havia acontecido em “O Som ao Redor”, “Aquarius” começa envolvendo o espectador lentamente, aos poucos, sem sinalizar os caminhos que percorrerá, misturando aqui e ali pistas falsas e verdadeiras do que será abordado, e talhando uma nunca menos que magnífica construção de seus fascinantes personagens. Paulatinamente vamos conhecendo Clara, mulher forte que transita com desenvoltura entre o passado e o presente. Que curte com a mesma intensidade tanto as descobertas musicais que o sobrinho lhe disponibiliza em formato digital, como sua invejável coleção de LPs em vinil. Muito bem resolvida, Clara exibe invejáveis equilíbrio emocional e beleza física de quem soube passar pelo tempo com sabedoria. Como ela própria diz, diante de uma grande contrariedade, ela pode até “ficar puta; mas estressados ficam vocês”. Direta e honesta, a protagonista levanta a bandeira da cristalinidade que seu próprio nome representa. Será justamente contra ela que se posicionarão as metralhadoras giratórias da ganância, do poder econômico e da livre concorrência. Como se fosse um edifício antigo e ultrapassado, Clara também precisa ser demolida, pois representa uma ética que não encontra mais lugar nos novos tempos do Deus dinheiro. E estorva os caminhos dos novos donos do poder.

Assim como já havia acontecido em “O Som ao Redor”, “Aquarius”  tem uma direção hipnótica, recheada de detalhes, olhares, inflexões de vozes que conquistam o espectador que, quando menos espera, se vê atrapado até o pescoço na trama proposta. Bem dosados, alguns enquadramentos, movimentações de câmera e inserts de imagem pouco usuais tiram o público de sua zona de conforto sem nunca correr o risco de cair em maneirismos gratuitos. O filme ainda arrebata com  um final catárquico que aqui em Gramado rendeu longos minutos de aplausos entusiasmados. E merecidos.

Novamente, Mendonça cria outra obra imprescindível para a filmografia brasileira, discutindo com criatividade temas urgentes da nossa sociedade divida.  Assim como já havia acontecido em “O Som ao Redor”. .

Celso Sabadin viajou a Gramado a convite da organização do Festival.