As Crônicas de Nárnia: O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa

Pouca gente deu atenção à morte do escritor Clive Staples Lewis. Os jornalistas do mundo inteiro estavam ocupados com outra tragédia mais “importante” acontecida exatamente no mesmo dia: o assassinato do presidente John Kennedy. Coisas da mídia. C.S. Lewis morreu em 23 de novembro de 1963, deixando uma vasta obra literária especializada no público infantil. E nela se encontram os sete livros da coleção “As Crônicas de Nárnia”, uma série de aventuras épicas recheada de fantasia que o cinema não ousou filmar até agora (há uma versão mais modesta feita pela TV inglesa em 1988, mas produzida em vídeo). Nem poderia ser diferente: só agora existe tecnologia suficiente em efeitos especiais para dar alguma veracidade a esta história tão fantástica.
No filme, tudo começa com os alemães bombardeando Londres, durante a II Guerra. Os irmãos Peter (William Moseley), Susan (Anna Popplewell), Edmund (Skandar Keynes) e Lucy Pevensie (Georgie Henley) têm sua casa destruída pelas bombas, e são mandados para o interior do país, à espera de tempos melhores. Acolhidos na gigantesca mansão vitoriana de um misterioso Professor Kirke (Jim Broadbent), eles tentam vencer o tédio brincando de esconde-esconde. E logo descobrem um guarda-roupas mágico que servirá de portal para o reino de Nárnia, um lugar de fantasias, reis, rainhas e seres mitológicos que – assim como o mundo real – também se encontra em guerra. É ali que os quatro irmãos desempenharão um papel fundamental para que o rei Aslan (voz de Liam Neeson) retome o poder, usurpado pela maligna Bruxa Branca (Tilda Swinton, ótima no papel). É pura fantasia!
Até pelo fato do livro já ter mais de meio século, é impossível não identificar em As Crônicas de Nárnia elementos que já fazem parte do imaginário infanto-juvenil. Como não associar, por exemplo, os irmãos Pevensie aos órfãos de Desventuras em Série? Ou mesmo às crianças da Família Von Trapp, de A Noviça Rebelde? E o guarda-roupas não seria uma versão com portas entalhadas do famoso espelho da Alice, de seu contemporâneo e xará Lewis Carroll? Isso sem citar o mundo fantástico criado pelo alemão Michael Ende em História Sem Fim. E se alguém notar semelhanças com a trilogia O Senhor dos Anéis, elas não aconteceram à toa: J.R.R. Tolkien foi amigo pessoal de C.S.Lewis, e ambos pertenceram até ao mesmo clube literário, na Universidade de Oxford.
Portanto, não cabe aqui tentar desvendar os mistérios sobre quem influenciou quem, e onde. O importante é que As Crônicas de Nárnia proporciona a todos os públicos uma empolgante viagem fantástica com conteúdo à moda antiga e técnica das mais modernas (embora ainda alguns efeitos sejam gritantemente digitais). Com direito a reis e bruxas, elfos e centauros, e uma mega batalha final envolvendo leopardos, rinocerontes e ursos. Tudo emoldurado pelo deslumbrante desenho de produção de Roger Ford (o mesmo da versão 2003 de Peter Pan) e comandado por Andrew Adamson, o diretor de dois dos maiores sucessos infanto-juvenis dos últimos anos: Shrek 1 e 2.
Vale cada um dos 140 minutos de filme.