“ATRÁS DA PORTA”: FILME E PROTAGONISTA PERTURBADORES.

Havia 8 anos que não chegava por aqui um filme do genial húngaro István Szabó, nome dos mais festejados pelo circuito artístico cinematográfico dos anos 80, principalmente pelos fantásticos “Coronel Redl” e “Mephisto”. Aos 74 anos, Szabó pode não ter mais o velho fôlego, mas seu novo e belo “Atrás da Porta” mostra que o cineasta não perdeu a mão nem a sensibilidade.

A história é baseada no livro de Magda Szabó, falecida em 2007, aos 90 anos de idade, escritora bastante popular na Hungria e que, apesar do sobrenome, não tinha nenhum parentesco com o cineasta. Uma das protagonistas também se chama Magda e também é escritora, mas os fatos retratados no livro – e consequentemente no filme – não são necessária e totalmente autobiográficos.

A Magda do filme é uma escritora que vive confortavelmente no interior da Hungria, nos anos 60. Para se dedicar aos seus livros, ela contrata Emerenc (Hellen Mirren, ótima como sempre) como empregada doméstica. Porém, torturada por profundos traumas de seu passado, Emerenc é uma mulher perturbada, agressiva e até violenta, quando contrariada de forma mais contundente. Não fica exatamente verossímil porque Madgda suporta tantas idiossincrasias de Emerenc, mas o fato é que ambas passarão a desenvolver uma relação que extrapolará os simples limites entre patroa e empregada.

Limites. Talvez seja este o tema principal do filme. Emerenc tem segredos, problemas, traumas, e uma maneira muito diferente de encarar a morte. É sem dúvida uma pessoa estranha. Mas de uma estranheza que, ela mesma reforça numa cena, jamais prejudicou ninguém. E mesmo assim paira sobre sua estranha figura uma névoa de mistérios do que poderia estar escondido por detrás da porta de sua pequena casa, que ela jamais abre para ninguém. Portas, corações e mentes estão trancados. Como fazer para abri-los? Quando podemos arrombá-los e – ato contínuo – invadi-los, incendiá-los e desinfetá-los? Quais os limites que separam a mera privacidade individual do egoísmo coletivo?

“É preciso aprender a matar”, diz Emerenc. “Deus mata”, conclui.

Algumas cenas de “Atrás da Porta” parecem apressadas, com cortes rápidos e destoantes que quase se assemelham à estética de um trailer. É incômodo. Mas não o suficiente para empanar a emoção da invasão que se processa sobre a casa e a alma da protagonista. O filme perturba. Assim como sua protagonista e as histórias que a transformaram que ela é.

Não teria sido esta justamente a ideia?