BELO DRAMA HOLANDÊS “A MONTANHA MATTERHORN” FALA DE SOLIDÃO E PRECONCEITOS.

O filme começa com uma citação sarcástica atribuída a Johann Sebastian Bach. Diz algo como tudo ser “muito simples”, bastando “bater nas teclas certas no momento certo”. Tanto o fino sarcasmo como o próprio Bach vão permear toda a trajetória do protagonista Fred (Ton Kas) no belo drama holandês “A Montanha Matterhorn”.

Fred é um homem solitário. Logo na primeira cena o conhecemos como o único passageiro de um ônibus que desfila calmamente diante de belíssimas paisagens campestres, a caminho de sua casa, situada num vilarejo tão pequeno e bucólico quanto tedioso.
Metódico e religioso, ele se enfurece ao descobrir que fora enganado no dia anterior, quando havia dado dinheiro para ajudar um homem supostamente em apuros por falta de gasolina em seu carro. “Não me importa que você minta para mim, mas ao mentir para mim você também mente para o Senhor”, reprime Fred. O tal homem (René Van`T Hof) parece não entender. Ou sequer ligar. Na realidade, logo Fred percebe que o rapaz tem problemas mentais. E acaba se afeiçoiando a ele, iniciando uma improvável amizade.
Irônico: ao assumir a atitude cristã de abrigar um necessitado, Fred se vê preconceituosamente banido de sua própria e hipócrita igreja.

Num Primeiro momento, percebem-se em “A Montanha Matterhorn” os variados “clichês-armadilha” típicos do cinema europeu autoral. O protagonista reprimido pronto para passar por um arco dramático libertador, o estranho antagonista excluído que será o principal agente da mudança do herói, o ambiente externo hostil e apegado a tradições arcaicas, além, é claro, do estilo silencioso e introspectivo da direção, que não hesita em flertar com o bizarro. Junte-se a isso uma trilha sonora salpicada de belos temas clássicos e uma direção de arte que sublinha uma certa tristeza decadente e solitária.
Porém, “A Montanha Matterhorn” tem a habilidade de surpreender. Felizmente nem tudo se desenvolve como seu início pressupõe, e aos poucos algumas novidades vão surgindo na trama. Os personagens ganham um sólido e afetivo desenvolvimento, fazendo com que o filme paulatinamente cresça em interesse, até desembocar num final que pode ser considerado catárquico.
O resultado é um trabalho cativante de Diederik Ebbinge, mais conhecido na Holanda como ator, e que faz aqui sua estreia como diretor de cinema. Uma estreia mais que promissora, que rendeu a seu filme os prêmios de público nos festivais de Moscou, Rotterdam e Valladolid.