BELO E MELANCÓLICO, “QUANDO MARGOT ENCONTRA MARGOT” REFLETE SOBRE O TEMPO E A VIDA.

Por Celso Sabadin.

Filmes que se utilizam do recurso dramatúrgico da “troca de papéis” podem ser considerados praticamente um subgênero a parte. Comédias como “Quero ser Grande”, “De Repente 30”, “Se Eu Fosse Você” e tantas outras estão amplamente consolidadas no imaginário popular, e na maior parte das vezes conquistam um bom público graças à sua conhecida e simplificada formatação: uma mágica qualquer (um desejo, uma descarga elétrica, uma pancada na cabeça, tanto faz) troca as posições dos protagonistas, fazendo com que eles vivam o outro lado da moeda da vida que tanto reclamam, passem pelo famoso arco dramático edificante, para retornar depois aos seus papeis principais e perceberem o quanto eram felizes e não sabiam.

Era esse tipo de filme que esperava encontrar depois de ver o trailer do longa francês “Quando Margot Encontra Margot”. Afinal, a trama fala de uma Margot que encontra a si mesma, no mesmo tempo/espaço, mas com 20 anos de diferença entre uma e outra. A mais velha tentará, assim, prevenir a mais nova das besteiras que ela fez durante a vida.

Minha expectativa de ver uma “Sessão da Tarde a Francesa” não se realizou: o filme se revelou bem melhor do que eu esperava. O roteiro de Sophie Fillières (também diretora do longa) acertadamente não se preocupa em criar mirabolantes soluções mágicas para tentar justificar a presença das duas Margots (Sandrine Kimberlain e Agathe Bonitzer, ótimas) de idades diferentes na mesma realidade. É a premissa do filme: aceita-se ou não, embarca-se ou não. Quem se dispuser a embarcar vai mergulhar no universo desta rica personagem dividida entre dois tempos, duas vivências, dois mundos separados por duas décadas. Sonhos, frustrações, erros, experiências, amores feitos e refeitos, cabe um pouco de tudo no confronto entre as duas Margots.

E mais: “Quando Margot encontra Margot”, ao contrário do que poderia facilmente se supor, não é uma comédia. Pelo contrário: o filme vem impregnado com o conhecido tédio depressivo francês, marca registrada de um povo que abertamente bufa na cara do próximo para demonstrar seu descontentamento. Melancólico e reflexivo, “Quando Margot encontra Margot” acerta em cheio ao não embarcar nas formulações desgastadas deste subgênero, muito menos propor malabarismos redentores em seu roteiro.

Trata-se de uma densa reflexão sobre a vida e sobre o tempo que tem tudo para agradar aos fãs do bom cinema francês e para desagradar quem está esperando apenas um novo “Quero Ser Grande”.

O filme é o primeiro a marcar a parceria entre a distribuidora brasileira Pandora (conhecida por seus filmes de enfoque mais artístico) e a rede mexicana Cinépolis (conhecida por exibir filmes mais comerciais). Torcendo pra dar certo.