BRASÍLIA 2017: “POR TRÁS DA LINHA DE ESCUDOS” MOSTRA QUE OU SE É JUSTO, OU SE É POLICIAL.

Por Celso Sabadin.

Em tempos de total intolerância, foi no mínimo corajosa a proposta do cineasta Marcelo Pedroso de mostrar o lado “inimigo” dos confrontos entre a Democracia e a Polícia. Principalmente neste estranho Festival de Cinema de Brasília, onde há poucos dias a cineasta Daniela Thomas foi praticamente “julgada e condenada” pelo “crime” de ser uma mulher branca de classe média e querer fazer um filme sobre escravos.

Neste seu novo longa, “Por Trás da Linha de Escudos”, Pedroso se mete “por trás das linhas inimigas” para investigar o cotidiano do Batalhão de Choque da Polícia Militar de Pernambuco, uma unidade treinada para lidar com multidões, atuando na repressão dos chamados distúrbios civis, categoria que inclui protestos e manifestações. A “estratégia” utilizada pelo cineasta é simples e eficiente: deixar que a câmera registre livre e abertamente as opiniões e o dia-a-dia dos elementos da corporação. As contradições internas do sistema surgirão naturalmente.

“Quem reflete sobre Justiça não deve ser policial” afirma, por exemplo, um dos comandantes da corporação. Base do pensamento militarista, a frase é lapidar e define, por si só, a própria essência do que o filme retrata: ou se é justo, ou se é policial. Chega a ser assustador também o entusiasmo eufórico de uma das componentes do Batalhão que explica ao cineasta, exultante de alegria, os horrores e as pressões que ela sofreu durante o curso que a capacitou para a função”. Marquês de Sade perde. Fala-se também em “adestramento” militar, palavra mais cabível a animais que a seres humanos, o que igualmente levanta uma série de interessantes questionamentos.

Diretor dos premiados “Brasil S/A” e “Pacific”, Marcelo Pedroso mostra mais uma vez que poucas “armas” têm tanto poder de fogo como uma câmera de cinema bem colocada. Não envereda pelo panfletarismo vazio que o tema poderia proporcionar, e deixa que a perplexidade do momento e as situação flua através da força das imagens. Como, por exemplo, os stills da população idolatrando e tirando selfies ao lado de policiais e veículos de choque, momento marcante desta nossa era na qual o documentário tem se mostrado cada vez mais apavorante que a mais terrível das ficções.