“BRÓDER” MOSTRA A MATURIDADE DE UM CINEASTA ESTREANTE.
Jefferson De sempre foi um cineasta bom de barulho. Causou polêmica gritando aos quatro ventos os preceitos do seu “dogma feijoada”, que defendia os negros no cinema, tanto diante como por trás das câmeras. Por um tempo, seu manifesto e sua figura eram até mais famosos que seus (bons) curtas. O tempo passou, o discurso de Jefferson amadureceu e a boa notícia é que seu primeiro longa, “Bróder”, mostra que o cineasta bom de barulho também é bom – digamos, ótimo – de cinema.
A primeira projeção do filme em território brasileiro, encerrando o Festival de Paulínia, foi ovacionada pela plateia. E não sem motivos. Multifacetado, “Bróder” apresenta vários níveis de entendimento e interpretações, abordando sem panfletarismos questões importantes como racismo, violência urbana e determinismo social.
Antes que as reacionárias patrulhas ideológicas do cinema brasileiro saiam rotulando que “Bróder” é “apenas mais um filme sobre favela e violência”, vale a ressalva: não é. O roteiro, assinado pelo próprio Jefferson e por Newton Cannito (antes dele virar Secretário do Audiovisual), fala de três grandes amigos de infância que trilharam caminhos diferentes na vida adulta: Marcu (Caio Blat), Jaiminiho (Jonathan Haagensen) e Pibe (Silvio Guindane, que também está no elenco de “5x Favela – Agora Por Nós Mesmos”, outro destaque de Paulínia).
Jaiminho venceu na vida profissional graças ao futebol. Atua no exterior, está lesionado, mas mantém uma forte esperança de ser convocado para a seleção brasileira. Pibe tenta a sobrevivência pelo estudo. Mora às margens do Minhocão (para quem não sabe, aquela via elevada horrorosa cometida por Paulo Maluf, em São Paulo) e tem sérias dúvidas sobre os rumos que sua vida vem levando. E Marcu é o único que permanece na chamada “comunidade”. Mais precisamente, em Capão Redondo, periferia paulistana. Tem um pé na família e outro no crime. Está no limite.
Os três rapazes voltam a se encontrar por ocasião da festa de aniversário de Marcu. Um reencontro que acenderá antigas questões, velhas mágoas mal resolvidas, e que seguirá por caminhos explosivos.
Durante o transcorrer do filme, o espectador será brindado com uma direção seguríssima, enquadramentos brilhantes e ótima utilização de trilha sonora que tornam difícil de acreditar que estamos vendo um filme de estreante. Os personagens são fascinantes, bem construídos e otimamente interpretados por um elenco que traz coadjuvantes de alto luxo, como Cássia Kiss, Ailton Graça e Zezé Mota.
A questão do racismo é enfocada com brilhantismo, na medida em que o filme propõe uma família composta por uma mãe branca (Cássia Kiss), um padrasto negro (Ailton Graça) e – transitando pela ambiguidade – um filho/enteado branco (Caio Blat). A cara do Brasil. Num primeiro momento, o personagem de Blat não era para ser branco. Mas Jefferson subverteu seu próprio roteiro para fomentar a questão. Ele conta que quando mandou o roteiro para Caio Blat, o ator respondeu dizendo que aceitava o papel e agradecendo: “Obrigado. Eu sempre quis ser preto”…

