“DIÁRIO PERDIDO”, MAIS DO QUE UM FILME SOBRE FAMÍLIA.

O título original do filme Diário Perdido é Mères et Filles, que, numa tradução literal, quer dizer Mães e Filhas. Numa leitura superficial, pode-se pensar em um filme sobre família, quando na verdade o filme vai além.

A história não é nada simples; ao longo de toda a projeção somos apresentados a novos conflitos e descobertas daquelas personagens. Tudo começa na avó, Louise, que nos anos 50 era uma mulher descontente com a sua posição: submissa ao marido, ter que ficar em casa e cuidar dos filhos (tarefas típicas de mulheres dessa época). Ela queria estudar e ter sua independência. Por isso, um dia foge de casa e deixa a custódia dos dois filhos pequenos para o marido.

Um deles é a filha Martine, que carrega um rancor enorme da mãe por tê-la deixado. Cresceu e se tornou uma mulher rígida e amarga. Teve também uma filha, Audrey, que juntas viviam, até então, uma difícil relação, com brigas e desentendimentos. Tudo muda quando Audrey se descobre grávida e, desorientada pelo novo, decide visitar a família. Sem querer encontra um antigo diário de sua avó e acaba embarcando numa viagem para redescobrir o passado das mulheres daquela família e, ao mesmo tempo, redescobrir suas próprias origens.

Cada personagem é esboçada com precisão pelo diretor. A geometria entre as três mulheres é bem construída e é sempre acompanhada por bons diálogos. Todas estão à frente do seu tempo, sendo possível afirmar que Diário Perdido não é um filme apenas sobre mães e suas filhas, mas também sobre grandes mulheres que mostraram sua personalidade firme no século XX. Seja na forma de pensar ou no estilo de vida, não importa, elas deixaram sua marca para a próxima geração.

Toda essa temática sobre o universo feminino e gerações de mulheres em uma família é apoiada por três grandes atrizes (Marie-Josée Croze, Marina Hands e Catherine Deneuve), que assumem com segurança seus papéis e demonstram firmeza nas suas respectivas personalidades. As cenas em que mãe e filha discutem, por exemplo, assustam pela violência de como as palavras são atiradas pela boca das personagens.

A diretora Julie Lopes-Curval acerta ao evitar usar flashbacks, rompendo o realismo e promovendo encontros atemporais entre a avó e a neta. As duas personagens interagem na tela, com a avó sempre dizendo palavras de conselho, de conforto. Esses encontros proporcionam as melhores cenas do filme. Lopes-Curval, que já foi vencedora do prêmio Câmera de Ouro de Cannes em 2002, conduz bem suas atrizes e aproveita de cada situação todo o potencial que ela oferece.

É um daqueles filmes que merece ser visto mais de uma vez, pois há sempre um detalhe novo ou uma interpretação nova a serem descobertos. Em uma semana com tantas estreias no Brasil (nove filmes no total), essa, sem dúvida, merece ser conferida.