DOCUMENTÁRIO SOBRE JAIR RODRIGUES É DESTAQUE NO É TUDO VERDADE.

Por Celso Sabadin.

Um pouco de música e alegria – que ninguém é de ferro – está entre os destaques da programação de hoje, 02 de outubro, do Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade. Às 15h00 será exibido “Jair Rodrigues – Deixa que Digam”, o mais que bem-vindo registro biográfico cinematográfico documental de um dos grandes astros midiáticos brasileiros dos anos 1960, 70 e 80: Jair Rodrigues.

Com direção de Rubens Rewald (que já havia dirigido Jair no ótimo “Super Outro”), o longa mostra a trajetória do artista com extenso material iconográfico, imagens de arquivo que irão emocionar quem viveu aquela época, e fartos depoimentos.

Ainda que dentro do que se espera de um documentário de narrativa clássica, “Jair Rodrigues – Deixa que Digam” levanta questões sintonizadas com as polêmicas contemporâneas, principalmente a respeito da causa negra, e sobre a ditadura militar que assolava o Brasil no momento enfocado.

É interessante como há depoentes que buscam associar Jair à luta racial que chacoalhava as estruturas sociais naqueles efervescentes anos 60 e 70, mesmo que as imagens e os depoimentos do próprio biografado deixem nítido que isto não acontecia. Percebe-se na própria indumentária de Jair o seu posicionamento, digamos, “a la Sidney Poitier”, ou seja, de se encaixar no estereótipo paletó-gravata-cabelos bem aparados do negro bem comportado aceito pelos brancos. E com repertório apoiado basicamente no samba, também território de “validação” que a supremacia branca “concede” aos negros que ela própria admite, desde que ela não se sinta ameaçada.

É irônico o momento em que Jair Rodrigues se orgulha de ter recebido o troféu Roquette Pinto – concedido na época aos melhores do rádio e da TV – certamente sem saber que a personalidade que empresta seu nome à premiação havia sido um célebre defensor das teorias racistas da eugenia.

Algo parecido também ocorre na questão política. Por mais que o próprio Jair se declare abertamente apolítico e “não entender nada” do assunto, há depoentes que preferem descontruir as próprias palavras do biografado.

Acaba ficando em segundo plano uma das mais contundentes denúncias do documentário que informa que a gravadora Phillips rescinde um contrato de mais de 30 anos com Jair Rodrigues porque a matriz holandesa ordenou um corte de 40% nas despesas de sua filial brasileira. Não foi um caso isolado. A devastação da música brasileira empreendida pelas gravadoras multinacionais que invadem predatoriamente nosso mercado a partir dos anos 1980 é um tema dos mais importantes que merece uma pesquisa cuidadosa e – por que não? – ou alguns documentários só sobre isso.

De qualquer maneira, só Jair cantando “Disparada”, na íntegra, já vale o filme, uma deliciosa viagem por grandes momentos da nossa música popular, hoje tão combalida.

Para ver, acesse gratuitamente www.etudoverdade.com.br