EM “À PROVA DE MORTE”, TARANTINO CONTINUA BRINCANDO DE CINEMA.

Até quando Tarantino vai brincar de fazer cinema? É visível que talento ele tem, mas fazendo uma rápida retrospectiva de sua carreira percebe-se que o que ele mais gosta de fazer, até o momento, é apenas brincar de filmar.

Em “Cães de Aluguel” ele brincou de Stanley Kubrick, e descaradamente copiou “O Grande Golpe”, que o velho mestre dirigiu em 1952. A mídia, desavisada como quase sempre, não percebeu e começou a endeusar Tarantino, que por sua vez também não se preocupou em mencionar algum crédito a Kubrick.

Depois, com “Pulp Fiction”, brincou com o subgênero dos romances policiais, e ganhou prêmios inimagináveis com sua molecagem. Molecagem que também não faltou em “Jackie Brown”, onde usou novamente algumas fórmulas de “Cães de Aluguel” (a manjada repetição de diferentes pontos de vista, por exemplo), escreveu um punhado de diálogos espirituosos e – com apenas três longas dirigidos na bagagem – foi alçado pela mídia à condição de gênio do cinema.

Voltou a dirigir longas somente depois de seis anos, quando resolveu brincar de filmes de kung fu com seus dois “Kill Bill”.

Em 2007, junto com o amigo Robert Rodriguez, realizou o projeto Grindhouse, mais uma brincadeira que consistia em imitar uma velha sessão de cinema, daquelas exibidas nos antigos drive-ins americanos, de muito sucesso nos anos 60 e 70. Rodriguez faria um longa (“Planet Terror”), Tarantino faria outro (“Death Proof”), e ambos cometeriam também alguns trailers e vinhetas falsas. Tudo isso junto formaria uma única sessão de cinema, como as de antigamente. O resultado comercial foi um fracasso, o que assustou as distribuidoras internacionais. Resultado: somente agora, mais de três anos depois, “Death Proof” chega ao Brasil, batizado como “À Prova de Morte”.

Do que se trata? De mais uma brincadeira de Tarantino, é claro.

A piada está em fazer um filme, em 2007, como se ele fosse uma produção de baixo orçamento rodada nos anos 70. Assim, as cores são saturadas como naquela época, a fotografia busca a luz estourada, e digitalmente são inseridos efeitos visuais que imitam os defeitos de um velho filme, como riscos, manchas e até “saltos” de projeção entre um rolo e outro, como era muito comum acontecer em antigas projeções. Divertido, sim. Mas por quanto tempo? Dez minutos talvez. Quinze? Com um roteiro pífio permeado por longos e enfadonhos diálogos que se supõem divertidos, o filme não se sustenta. Mesmo porque a cópia exibida no Brasil é igual à europeia, com 114 longos minutos de duração, enquanto a norte-americana foi enxugada para 87.

A tênue trama fala da bela DJ Jungle Julia (Sydney Poitier, filha do antigo astro Sidney Poitier – repare que só muda o “y”) que sai para se divertir com suas não menos belas amigas pelo interior dos EUA. Ao chegar num poeirento bar de beira de estrada, elas conhecem um estranho dublê de cinema (o termo em inglês é “stuntman”) que diz se chamar Stuntman Mike, para o desespero dos tradutores. O papel é de Kurt Russell. Na verdade, além de dublê, ele é um psicopata que atrai belas mulheres para o seu carro, onde as assassina violentamente com manobras radicais. E nada mais.

Mais uma vez Tarantino aposta na violência gráfica e nos longos diálogos recheados por jogos de palavras para estruturar seu filme. Exemplo? Lá vai:

Stuntman Mike – Eu assusto você?
Arlene concorda com a cabeça.
Stuntman Mike – É a minha cicatriz?
Arlente – É o seu carro.

Traduzido, o diálogo não traz atrativos, mas a brincadeira sonora com scar (cicatriz) e car (carro) é uma das marcas registradas de Tarantino. É o mesmo caso da piada do filme velho: por quanto tempo ela consegue divertir ou pelo menos entreter? Dez minutos? “Pulp Fiction” já não teria esgotado o estoque tarantinesco de diálogos nonsense supostamente inteligentes?

Inconsistente, “À Prova de Morte” é uma das brincadeiras mais fracas do diretor. Após assisti-lo, fica fácil perceber porque o filme permaneceu durante três anos no limbo da distribuição brasileira, sem pressa para estrear.

Dois anos após “À Prova de Morte”, Tarantino se deu bem melhor em “Bastardos Inglórios”… desta vez brincando de fazer filme de guerra…

Confira o trailer: