EM “ALMA IMORAL”, SÓ A TRANSGRESSÃO LEVA À LIBERDADE.

Por Celso Sabadin.
 
Nos primeiros minutos de “Alma Imoral”, tomei um susto. Estranhei e pensei comigo mesmo: “Eita, depois de uma carreira inteira dedicada ao documentário político, o Sílvio está falando de Bíblia! É o fim dos tempos mesmo!”. Depois de alguns minutos, percebi que minha primeira impressão – ufa – estava errada. “Alma Imoral”, o novo documentário de Sílvio Tendler, é um trabalho sério e instigante sobre transgressão, conduzido de forma profunda pelos caminhos da Filosofia.
 
O filme se baseia no livro do Rabino Nilton Bonder, que já havia inspirado anteriormente uma peça de teatro. Tomando como ponto de partida trechos de passagens bíblicas, “Alma Imoral” defende a transgressão como a única possibilidade viável de libertação contra ações opressoras. Para o texto da obra, por exemplo, Abraão sinalizar que poderia de fato matar seu filho Isaac, conforme Deus lhe ordenara, seria a única forma de efetivamente se contrapor ao Criador, obtendo assim sua “libertação”. Sem dúvida, uma intepretação polêmica dos textos religiosos que certamente incomoda os mais ortodoxos. Os mesmos ortodoxos que com certeza torcerão seus quipás ao ver no filme exemplos de belos e humanitários atos realizados por rabinos em defesa da homossexualidade.
Adultério, ateísmo, rupturas, arte, ciência e – claro – política, também estão na pauta do longa.
 
O personagem condutor de “Alma Imoral” é o próprio Rabino Bonder , que entrevista destacados transgressores do pensamento e da atualidade em sua própria “tribo”, como Frans Krajcberg, Michael Lerner, Rebbeca Goldstein, Etgar Keret, Uri Avneri, Reb Zalman Schachter, Rabino Steven Greenberg, Noam Chomsky, além dos filhos de Julius e Ethel Rosenberg, o casal executado em 1953 num explosivo caso de suposta espionagem internacional. As várias entrevistas são intercaladas com coreografias da Cia. de Danças Debora Colker, enquanto Bel Kutner, Júlia Lemmertz, Letícia Sabatella, Mateus Solano e Osmar Prado se revezam na locução.
 
 
Três perguntas para Sílvio Tendler.
 
1. Você, que sempre se pautou por uma intensa atividade política focada em Brasil, como abraçou neste projeto internacional?
Tendler – Minha vida sempre foi pautada pelo humanismo judaico. Sou judeu graças a uma identidade mais cultural do que religiosa. O livro Alma Imoral é muito interessante pelo lado da compreensão de que os transgressores e as transgressões transformam o mundo. A proposta de fazer o filme foi minha.
 
2. Como foi trabalhar em pareceria com Nilton Bonder, a partir do texto prévio de um livro?
Tendler – O Millôr Fernandes dizia que “Arte é Intriga”. Comigo e com o Rabino não foi diferente e a relação compreendeu uma tensão necessária a toda obra de arte. No final deu tudo certo. Foi bom.
 
3. Como você vê a tentativa da direita brasileira de se aproximar de Israel para os fins eleitoreiros que o atual presidente utilizou, inclusive com o amplo uso das bandeiras daquele país?
Tendler – Com muita tristeza. Como respondi acima, sou pautado pelo humanismo judaico e ver o então candidato a presidente na Hebraica me fez muito mal e estive entre os que protestaram contra sua presença no clube da minha infância. Somos muito maiores do que isso e tenho certeza de que esse momento será superado.
 
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