EM DVD, “A GRANDE NOITE” SATIRIZA O CONSUMISMO COM HUMOR.

Benoît (Benoît Poelvoorde) e Jean-Pierre (Albert Dupontel) são dois irmãos quarentões que não se encaixam no atual mundo consumista. Jean-Pierre, punk assumido, já desistiu até de tentar: mudou seu nome para Not e sobrevive de esmolas e pequenos furtos. Benoît, porém, continua insistindo, e seu emprego como vendedor de colchões praticamente o leva à loucura. Not tenta ajudá-lo. Corta seu cabelo à moda punk e o orienta a tirar a gravata, pois “cão livre não usa coleira”.
Ambos estão perdidos num mundo de pessoas que, segundo eles próprios dizem, não estão mais nos campos, nem nas igrejas, mas estão todas sozinhas em suas casas.

Em ritmo de comédia dramática, “A Grande Noite” (não confundir com o homônimo de Stanely Tucci, de 1996) é o mais recente trabalho dos diretores Gustave de Kervern e Benoît Delépine, a mesma dupla que realizou “Mamute”. O alvo principal é a sociedade de consumo, e a forma como ela elimina individualidades e pasteuriza seres humanos. Não por acaso, boa parte do filme se passa em supermercados, shopping centers e estacionamentos. Todos devidamente supervisionados por onipresentes câmeras de segurança.

Para qualquer dificuldade, a desculpa é sempre a mesma: “a crise”, e até mesmo o atendente do banco ganha seu momento de crítica ao afirmar ser contra as contas-conjuntas entre marido e esposa: “O amor precisa de mistérios”, acredita o filosófico bancário. É neste clima de fábula non-sense que “A Grande Noite” se desenrola, mesmo porque não há como negar que os próprios supermercados e shopping centers são, eles próprios, verdadeiras fábulas non-sense.

Escancarando a inversão de valores, são os irmãos que não se adaptam os que se tornam marginalizados e que buscarão, à sua maneira, a singela “vingança” contra o sistema que o título propõe.
Grandes planos gerais sublinham a aridez do espaço cênico e o distanciamento humano dos protagonistas com o que deveria, mas não consegue ser, seu meio social. Aliás, não há meios sociais; apenas individuais.

Em participação-relâmpago, Gérard Depardieu vive um divertido vidente que só diz mentiras: “A verdade é bela demais para que a gente possa suportá-la”, ele diz.

Crítico sem ser panfletário e instigante sem ser genial, “A Grande Noite” ganhou o Prêmio Especial do Júri na mostra Un Certain Regard, em Cannes.