EM “GRAN TORINO”, CLINT EASTWOOD DÁ OUTRO SHOW DE DIREÇÃO.

Recentemente os jornais anunciaram que a Ford norte-americana fechou o ano com um prejuízo em torno dos US$ 15 bilhões. Não, você não se enganou: esta matéria é sim sobre Cinema, e não sobre Economia. A informação tem tudo a ver com o filme “Gran Torino”, o mais recente trabalho dirigido, produzido e estrelado por Clint Eastwood.

É o próprio diretor quem interpreta o rabugento Walt Kowalski, um homem amargurado, irascível e de mal com a vida. Orgulhoso de ter combatido na Coréia, ele exibe ostensivamente a bandeira norte-americana na fachada de sua casa, e não hesita nem por um segundo em defender o seu precioso gramado empunhando um velho rifle. Walt é racista. Muito racista. E rosna como um animal. Ex-funcionário da Ford, ele não perdoa seus filhos por comprarem carros japoneses. É como se Dirty Harry tivesse envelhecido mal. O que talvez Walt ainda não saiba é que ele – assim como sua querida Ford – também está em extinção. Um ser humano emocionalmente falido que talvez represente o fim de uma era de intolerância e xenofobismo. Mas que talvez ainda tenha uma chance de redenção.

O roteiro e o argumento de “Gran Torino” são assinados por Nick Shenck e David Johannsson, dois estreantes na tela grande que levantam o interessante caso dos Hmong, uma cultura oriental proveniente da região do Sudeste Asiático que vem fixando moradia em alguns estados do meio-oeste americano. E assim como tantas outras comunidades de diferentes origens raciais, ao chegar em território norte-americano, os Hmong também acabam formando guetos e gangues. Para o bem e para o mal. Sob os olhares preconceituosos do red neck americano, todos são “China”.

Pouquíssimos atores conseguiriam interpretar com tanta empatia e dignidade um personagem tão desagradável como Walt Kowalki. Clint Eastwood é um destes pouquíssimos. Não se via nos cinemas um velho rabugento ao mesmo tempo tão asqueroso e tão fascinante desde Henry Fonda em “Num Lago Dourado”. Quem mais seria capaz de rosnar com honra? Além desta sua brilhante performance, Clint entrega outra magnífica direção. Novamente ele se apóia sobre os cânones clássicos do cinema para fazer aquilo que sabe melhor: contar bem uma boa história. Sem nenhuma outra pretensão estética ou visualmente mirabolante. Rezando pela velha cartilha, tudo está lá: narrativa linear; plano e contraplano; começo meio e fim; tradicionais viradas de roteiro; contrapontos cômicos; redenção final. Todas aquelas coisas que – nas mãos do velho Clint – fazem o filme valer cada minuto.