EM “ILHA DO MEDO”, NADA É O QUE PARECE SER.

Perturbador. Assim é possível definir o novo filme de Martin Scorsese baseado no livro Paciente 67, de Dennis Lehane (autor de Sobre Meninos e Lobos).

Nunca o que vemos na tela parece certo. O filme quer sempre confundir o espectador; às vezes parece que estamos vendo um drama de guerra, depois parece um filme de conspiração policial, ou então um drama familiar. O diretor quer te enganar, e consegue. Ele vai revelando os segredos muito aos poucos, esticando ao máximo a tensão e o suspense.

A história deste thriller se passa na ilha de Shutter onde há um presídio/sanatório para criminosos insanos. Local que faria o Coringa de Heath Ledger se sentir em casa e enturmado. Uma das prisioneiras consegue misteriosamente fugir de sua cela e desaparece na ilha. Para investigar o crime, são chamados dois policiais federais (Teddy e Chuck) que acabam imersando numa realidade onde nada é o que parece.

A atmosfera do filme lembra muito o Iluminado, de Stanley Kubrick, onde já nos créditos iniciais nos damos conta do que vem pela frente, e que não vai ser fácil. Tudo envolvido por uma música enigmática, aumentando ainda mais o mistério. Scorsese não modera em exprimir na tela cenas visualmente muito chocantes, com cadáveres empilhados, sangue e crianças de olhos esbugalhados (outra cena que lembra o Iluminado). Por isso, se você tem estômago fraco, este filme não é para você.

O diretor mostra que ainda sabe fazer bons movimentos de câmera e usa pequenos truques para confundir ainda mais o espectador, como trocar objetos do cenário e inverter o eixo de ação da cena. O roteiro usa e abusa da fórmula de conspiração psicológica em que tudo que é dito pelo personagem acaba sendo usado como prova de sua insanidade (algo que Clint Eastwood também mostrou em A Troca); é clichê, mas no filme está bem usado.

Leonardo DiCaprio no papel principal está muito bem, encarna um personagem atormentado por seus fantasmas do passado (a vida militar e a morte da esposa num incêndio) e transmite muito bem seus momentos de medo, de tensão e tristeza. Esta é a sua quarta contribuição com Scorsese e esta parceria está se mostrando quase tão produtiva quanto a do diretor com De Niro (será que um dia veremos um filme com os três juntos?). O elenco secundário também está bem: Mark Ruffalo (Onde Vivem os Monstros) como o sinistro policial, Ben Kingsley (Xeque-Mate) e Max von Sydow (Minority Report) como os vilões, e também Jackie Earle Haley (o Rorschach de Watchmen) e Patricia Clarkson (Vicky Cristina Barcelona) que, mesmo ambos aparecendo em uma única cena do filme, mostram tridimensionalidade em seus personagens.
Os horrores acontecidos em Shutter Island combinam com o interior da mente de Teddy, personagem de DiCaprio, já que, cada vez que o mal aumenta, a fúria da natureza se intensifica e muda o cenário que antes parecia tão em ordem.

Mas esse senso de ordem não era o que parecia mesmo.