EM “O AMANTE DUPLO”, OZON BRINCA DE HITCHCOCK.

Por Celso Sabadin.

Acredito que todo cineasta queira, pelo menos uma vez na vida, brincar de Hitchcock. François Ozon não seria diferente. Mesmo porque ele tem crédito: diretor de “O Tempo que Resta”, “Potiche”, Oito Mulheres” e um punhado de representativos sucessos franceses, Ozon é um dos diretores mais badalados pelo mercado cinematográfico de seu país. E não faz feio com seu (mais ou menos) hitchockiano “O Amante Duplo”.

Logo no início do filme, um belo plano de uma escada em caracol, referenciando “Um Corpo que Cai”, já explicita a homenagem ao Mestre do Suspense. Não demora muito, quase nada, para o roteiro (inspirado no livro “Lives of the Twins”, publicado em 1987 por Joyce Carol Oates) abordar um tema dos mais recorrentes no cinema: o duplo. Seja o duplo das milenares lendas germânicas, de Dostoiévski, ou das teorias da psicanálise. É neste contexto que o filme acompanha Chloé (Marine Vacht, que já havia trabalhado com Ozon em “Jovem e Bela”), uma ex-modelo que vai tentar resolver seus problemas emocionais e existenciais consultando-se com o psicoterapeuta Dr. Mayer (Jérémie Renier, de “My Way”). A escolha não se mostra das mais satisfatórias, pois logo Chloé descobre que seu terapeuta pode ser tão ou mais problemática que ela própria. Pelo menos, é o que parece.

O conhecido joguinho cinematográfica de alternar repetidamente o que “é” com o que “parece” passa a ser a base do filme. Como “Uma Mente Brilhante”, “O Sexto Sentido”, o recente “Tully” e até “Gêmeos – Mórbida Semelhança”, “O Amante Duplo” se desenvolve na linha que alguém já chamou de “filme que se passa dentro da cabeça do protagonista”. O que não é necessariamente um problema, mas que deixa transparecer uma certa falta de originalidade, mesmo com a direção sempre elegante e segura de Ozon. Espelhos, transparências, vidros e planos divididos ajudam a ratificar o tema básico da trama, que vai explorar até o seu final os limites da dicotomia ilusão/realidade.

Selecionado para a mostra competitiva de Cannes, “O Amante Duplo” não chega a ter o frescor nem a genialidade dos trabalhos anteriores do diretor, mas funcionando como entretenimento. Estreia em 21 de junho.