“ESTAÇÃO DO DIABO”: GOVERNO CORRUPTO E POPULAÇÃO PASSIVA. NAS FILIPINAS, CLARO.

Por Celso Sabadin.

É cada vez mais comum – se não obrigatório – que todo artista desenvolva seu marketing pessoal, que imprima uma marca e/ou um estilo ao seu trabalho que, não raro, é superior à sua própria arte. Ou pelo menos mais midiático. Uma das ferramentas de marketing do cineasta filipino Lav Diaz, por exemplo, é fazer filmes longuíssimos, de 4, 5, 6, 7 horas de duração. Mesmo se os objetos de seus filmes não requererem – como de fato não requerem – tamanhas durações, tal excentricidade acaba por se estabelecer como uma espécie de marca registrada do cineasta, garantindo-lhe a tão necessária notoriedade para se destacar da multidão.

Seu trabalho mais recente – “Estação do Diabo” – não foge à regra. São quase quatro horas que mostram como nas Filipinas dos anos 70 os policiais controlados por militares, e sob as vistas grossas do governo corrupto de Ferdinand Marcos, utilizam o terror sobre a população local como instrumento de controle social. Não somente o terror físico e corporal, como também o psicológico. Em meio ao caos, forma-se uma pequena resistência, na qual o poeta, professor e ativista Hugo Haniway procura descobrir a verdade sobre o desaparecimento de sua esposa.

Como os frequentadores dos circuitos de artes e festivais já sabem, não faz parte do estilo de Lav Diaz facilitar a vida de ninguém, muito menos sucumbir às regras do mercado. Além das quase quatro horas de duração,

“Estação do Diabo” é rodado em preto e branco, e sempre com a câmera fixa, que explora com muito talento os belíssimos enquadramentos do diretor. Ah, quase esqueci: e o filme é um musical!

O resultado é uma experiência única, um trabalho que exige imersão profunda e um descolamento absoluto da vida e do ritmo do lado de fora do cinema. E que acaba proporcionando momentos de puro êxtase, como o que se percebe num dos seguintes textos que o filme oferece:

“Você também faz parte daqueles que se mantêm em silêncio e fingem não ver as coisas, enquanto nas ruas predadores a céu aberto assustam e matam seus compatriotas indefesos? (…) Você costumava ir para as ruas, bravo, gritando, com os punho cerrados, resistindo e indo contra qualquer violação dos direitos humanos, e para cada violação feita à pátria, você apaixonadamente disse não. Por que você está em silêncio desta vez, e tão gentil quanto um cachorrinho? Imagino qual é o gosto do traseiro que você está lambendo.”

Identificou-se?