ETERNOS PRECONCEITOS: SERÁ A “BENEDETTA”?

Por Celso Sabadin.

Acredito que seja muito difícil precisar, com alguma exatidão, o que realmente aconteceu com a freira italiana Benedetta Carlini, que teria escandalizado a sociedade e o clero de século 17. Mesmo porque, quando se trata de Igreja e de processos de canonização, a verdade é a primeira a pular fora.

Assim, prefiro ver “Benedetta”, mesmo que anunciado como baseado em acontecimentos reais, não como algo que retrata uma história de três séculos atrás, mas sim como um filme extremamente atual. Afinal, toda a contemporaneidade está lá: a madre superiora cujo maior interesse no gerenciamento de seu convento é o dinheiro, a prepotência machista das instituições que acreditam que apenas os homens podem “julgar” as mulheres, os preconceitos contra a homossexualidade, a manipulação dos acontecimentos por parte dos poderosos de maneira que melhor lhes sirvam para o convencimento da população… tudo muito século 21, infelizmente, ainda.

De passado, resta a ambientação. Tudo acontece na Toscana do século 17, quando a pequena Benedetta, perturbada por visões religiosas desde a infância, é negociada por seu pai em um convento local, tornando-se noviça. A menina cresce (passa a ser interpretada pela belga Virginie Efira), as visões se intensificam,  ela acredita ser a escolhida de Jesus (Jonathan Couzinié)  – inclusive como esposa – e se transforma em objeto de desejo de sua colega Bartolomea (Daphne Patakia) e de ciúmes de quase todo o restante do convento.

Transformando-se cada vez mais em figura contestatória e revolucionária – embora nem ela própria pareça ter tal consciência – Benedetta escreve certo por linhas tortas (opa… esse era outro, eu acho…), hábito não muito saudável aos olhos sempre reacionários da Igreja.

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“Benedetta” é baseado no livro “Immodest Acts: The Life of a Lesbian Nun in Renaissance Italy”, de Judith C. Brown, historiadora e reitora do College of Arts and Humanities, em San Francisco, EUA. Especializada na renascença italiana, ela é considerada uma das primeiras estudiosas da história da sexualidade, e é autora de vários livros, artigos e ensaios sobre o tema.

O roteiro é de David Birke em parceria com o holandês Paul Verhoeven, também diretor do filme, cineasta que fez muito sucesso nos anos 1980 e 90 com “Robocop”, “O Vingador do Futuro” e “Instinto Selvagem”, entre outros.

Com belíssimas locações em conventos franceses e na Itália, “Benedetta” foi coproduzido por França, Bélgica e Holanda, e foi selecionado para as mostras competitivas de Cannes e San Sebastian.

A estreia no Brasil é nesta quinta, 13 de janeiro.