FALTA A CRIATIVIDADE DE NOEL NO FILME SOBRE NOEL

A vida do compositor Noel Rosa (1910-1937) foi cinematográfica por natureza. Nela não faltaram paixões exacerbadas, uma incrível dose de talento, noites não dormidas, um defeito físico no rosto, e a morte em plena juventude. Tudo isso tendo como pano de fundo a romântica boemia carioca do início do século 20. Matéria prima de primeiríssima qualidade para o cinema.
Infelizmente, porém, ainda não foi desta vez que a cinematografia nacional ganhou uma bela obra sobre Noel Rosa. O filme “Noel – Poeta da Vila”, ainda que tenha méritos, está bem aquém da genialidade criativa do grande compositor.
Dirigido de forma clássica e tradicional por Ricardo Van Steen (realizador do curta “Com que Roupa”, de 1996), o filme acompanha as trajetórias musical e pessoal de Noel (aliás, indivisíveis), com destaque para dois dos grandes amores de sua vida: a jovem operária Lindaura, e a fogosa dançarina Ceci. Tecnicamente, trata-se de um filme digno, bem acabado, mas que deixa no ar uma certa dose de ingenuidade narrativa, como nas antigas cinebiografias hollywoodianas dos anos 40 e 50. As canções, por exemplo, parecem brotar instantaneamente da inspiração do compositor, já prontas, nascidas romântica e abruptamente de um olhar ou de um sentimento fugaz. O personagem Mário Lago, por exemplo, se apresenta em cena de forma burocrática, simplesmente verbalizando “Meu nome é Mário Lago”. Não poderia haver uma solução de roteiro mais cinematográfica?
O ator Rafael Raposo, vivendo Noel, não faz feio. Pode não ser fisicamente muito parecido com o verdadeiro – o que nem é muito importante – mas tem o carisma, o vigor a e jovialidade necessários ao papel. Talvez o maior problema do filme seja justamente ter optado por uma formatação convencional para retratar um poeta e compositor que passou toda a sua – curta – vida quebrando estas mesmas formatações.
A música e a belíssima cena final, contudo, valem o preço do ingresso.