FAM 2020: “MATAR A UN MUERTO” EXALA A PODRIDÃO DAS DITADURAS.

Por Celso Sabadin.

O ano é 1978. Em algum canto qualquer do Paraguai esquecido por deus, dois homens totalmente isolados do mundo têm uma tarefa insólita: enterrar clandestinamente corpos que lhe são entregues por alguém que nunca aparece. Estes coveiros da verdade fazem seu serviço como se fosse qualquer outro, com a mesma indiferença de quem estivesse, por exemplo, construindo um muro ou desmatando um terreno. Há apenas duas ligações dos dois homens com algum tipo de mundo supostamente civilizado lá fora. Um radiocomunicador que lhes informa quando chegarão novos “pacotes” a serem enterrados, e um outro rádio, este comum, que supostamente os conectaria – aí sim – com algo importante: as transmissões da Copa do Mundo de Futebol, na vizinha Argentina.

Não se percebem, todavia, conexões dos homens com algum tipo de conduta moral.

Tudo vai bem – dentro do que possa ser possível chamar de “bem” para dois coveiros clandestinos – até que algo insólito acontece. E não é na Copa do Mundo.

O roteirista e diretor Hugo Giménez demonstra grande talento nesta que é sua estreia no longa ficcional. “Matar a un Muerto” carrega um clima de pesado silêncio de morte e de uma dolorida indiferença que envolve seus protagonistas amorais, situados acima do bem e do mal. A mata fechada, a chuva constante, a lama e a sujeira (em vários níveis) nas quais chafurdam os dois personagens principais criam uma cruel cumplicidade com o silêncio das forças destrutivas das ditaduras que naquele momento sufocam toda a América Latina. Há um clima podre no ar, na terra, nos homens, na água, na mata, na Copa do Mundo.

A programação completa do FAM, mais os acessos a palestras e filmes estão em www.famdetodos.com.br