“GASPARD” E “O ORGULHO”: DOIS FRANCO-BELGAS DE ESTÉTICA GLOBALIZADA NO VARILUX 2018.

Por Celso Sabadin.

Não se trata de um fenômeno exclusivo do cinema francês, mas sim de todo o mundo globalizado: a cada ano que passa, as cinematografias dos mais diversos países buscam a repetição de fórmulas baseadas nas estéticas já popularmente consagradas pelo cinema dominante norte-americano. Alguns anos atrás, os filmes tinham a “cara” de seus países, ou seja, era mais ou menos factível o reconhecimento de um “filme polonês”, ou um “filme iraniano” ou um “filme francês”. Havia algo como uma gramática cultural local/regional, que diferenciava as criações cinematográficas umas das outras. Contemporaneamente, isto se perdeu, as estéticas se diluíram, e são cada vez mais raras e honrosas as exceções que caminham na contramão da globalização. Em outras palavras, todos querem fazer dinheiro.

Tal tendência pode ser verificada, por exemplo, em dois filmes presentes no Festival de Cinema Varilux, atualmente em cartaz em várias cidades brasileiras: “A Excêntrica Família de Gaspard” e “O Orgulho”.

Dirigido por Antony Cordier, também coautor do roteiro, “A Excêntrica Família de Gaspard” é basicamente um refogado de alguns filmes já vistos. Só seu ponto de partida – um rapaz que pede a uma garota praticamente desconhecida que ela o acompanhe até um casamento que ele preferiria não ir – já foi utilizado num punhado de comédias românticas por aí. O desenvolvimento deste mote também não é dos mais originais, mostrando que a família do moço é uma amalucada mistura de adoráveis maluquetes do bem, o que dá margem a uma série de situações cômicas e dramáticas sob um pano de fundo ecológico, já que – surpresa –  eles são proprietários de um zoológico particular. Dizer que os protagonistas ficam juntos no final não é spoiler: é apenas o coroamento lógico e previsível de uma formulação previamente testada e aprovada em outros filmes.

 

Não que “A Excêntrica Família de Gaspard” seja um filme ruim, longe disso. Afinal, quem não gosta da segurança de um bom e conhecido refogado? Ele é simpático, flui com desenvoltura, traz boas interpretações, e até aborda (tangencialmente) as mais recorrentes questões derivadas dos sempre complicados problemas familiares. Só não é criativo, só não é muito original. Relevando-se esta questão, acaba se configurando num agradável e inofensivo entretenimento coproduzido por França e Bélgica.

O mesmo se pode dizer de “O Orgulho”, filme que se traveste de drama supostamente preocupado com a questão dos imigrantes muçulmanos na França para (re)montar pele enésima vez uma das estruturas de roteiro mais manjadas da história do cinema: protagonista A e protagonista B, em conflito direto e frontal entre si, são forçados a contragosto a desenvolver juntos uma determinada ação na qual, durante o filme, ambos perceberão que só sairão vitoriosos se apararem suas arestas e, consequentemente, se transformarem em pessoas melhores e mais tolerantes.

No caso de “O Orgulho”, temos um professor reacionário (Daniel Auteuil, ótimo como sempre) que logo no primeiro dia de aula destila seu arsenal de preconceitos contra a jovem aluna (Camélia Jordana), descendente de muçulmanos, provocando revolta na Universidade de Paris. Trata-se de outro filme que todos nós já vimos um punhado de vezes, ainda que aqui alicerçado na questão racial muçulmana, o tema queridinho do momento do cinema francês, indispensável para qualquer diretor ou produtor que deseje revestir seu filme de uma aura de relevância humana e política.

Vale aqui o mesmo raciocínio do início deste texto: “O Orgulho” é um filme ruim? Muito pelo contrário. Os diálogos são saborosíssimos, as interpretações excelentes, o ritmo é empolgante e o público fica preso na poltrona até o último momento. Altamente recomendável. Mas não deixa de ser uma releitura franco-belga dos mais convencionais clichês de produtos audiovisuais norte-americanos que vemos há décadas. Só faltou a grua na última cena; o resto tem. A direção é do israelense Yvan Attal, mais conhecido como ator em diversos filmes, e o roteiro tem a assinatura e a colaboração de cinco profissionais… como costuma ser no cinema dos EUA.

 

A programação completa do Festiva Varilux está em http://variluxcinefrances.com/2018/programacao