“GRAÇAS A DEUS”, INTENSO E NECESSÁRIO.

Por Celso Sabadin.

Para abordar um tema dos mais sérios, o celebrado diretor francês François Ozon (o mesmo de “Potiche”, “Jovem e Bela”, “Ricky” e tantos outros) abandona seu estilo muitas vezes cifrado e embarca numa narrativa mais linear. A opção se mostra acertada: os fatos que Ozon tem a relatar em “Graças a Deus” tornam-se ainda mais cruéis dentro desta estética crua e realista que o cineasta empregou na obra.

A partir de acontecimentos reais, o próprio diretor roteiriza a história da criação da “La Parole Liberée”, uma associação de vítimas que – décadas depois dos fatos ocorridos – decidiram finamente denunciar o cardeal francês Phillipe Barbian, arcebispo de Lyon, por assédio infantil. As então crianças assediadas – hoje homens feitos – reúnem forças e coragem para remexer num passado dolorido, em busca de justiça. Cada qual tem sua história e trajetória. Há quem tenha conseguido superar o problema e tocado a vida em frente. Há quem desabou. Há quem carrega sérias consequências. Há quem prefira o impacto da mídia. Há quem atribua o crime a uma pessoa, e há quem o atribua a toda uma instituição ou religião. É sobre estas diferenças que se constrói a riqueza do filme, posto que a busca pela justiça acaba, mais cedo ou mais tarde, criando um doloroso denominador comum em todo o grupo.

Também assume importância fundamental no roteiro a denúncia do corporativismo da Igreja Católica. O assediador em questão é mostrado como uma pessoa desequilibrada mentalmente que, além de não ter dificuldades em reconhecer seus crimes, em várias oportunidades pediu ajuda aos seus superiores, que preferiram o acobertamento, igualmente criminoso. O silêncio é sempre a opção mais corrosiva.

Intenso e necessário, “Graças a Deus” ganhou o Grande Prêmio do Júri no Festival de Berlim.