“GRASS”, UM PEQUENA  JOIA GIGANTESCA.

Por Celso Sabadin.

Em determinado momento de “Grass”, de Hong Sang-soo, um personagem afirma ter escrito dois roteiros para cinema, mas que nenhum deles estava concluído. Talvez seja esta a chave para este onírico e poético filme coreano: pedaços de roteiros, trechos de vidas espalhados pela tela, fragmentos preciosos de emoções lançados sobre o espectador sem nenhum tipo de preparo prévio. E que tampouco trará desfechos.

A tênue linha narrativa de “Grass” é conduzida por uma jovem (Kim Min-hee, a atriz preferida de Hong) que fica horas sentada num café, ao lado de seu notebook. A garota presta atenção em tudo à sua volta, olha, observa, escuta trechos das conversas alheias… e escreve. Ela é os olhos, os ouvidos e o coração do espectador.

A partir desta simplicíssima premissa, a mágica que se desenrola diante dos nossos olhos é algo que só quem tem o pleno domínio do cinema consegue performar. Em “Grass”, assim como em vários outros filmes do premiadíssimo cineasta coreano (“Hotel à Beira do Rio”, “Na Praia à Noite Sozinha”, “O Dia Depois”, entre cerca de 20 outros), é quase impossível tirar o olho da tela. Hong tem a rara capacidade de, em segundos, construir personagens da mais intensa carga dramática, que passamos a acompanhar com total devoção, mesmo sem saber de suas histórias pregressas, e sabendo de antemão que aquelas viagens particulares dificilmente serão brindadas com algum tipo de conclusão.

O intenso preto e branco, os longos planos, a sobriedade das movimentações de câmera, o texto, e as não menos que perfeitas performances de seus atores formam um conjunto, no mínimo, hipnótico. A utilização da trilha sonora – silêncios incluídos – é um capítulo à parte: o dono do pequeno café que serve de cenário às tramas faz com que em seu estabelecimento só sejam tocadas peças clássicas. Que poderão combinar perfeitamente com os sentimentos destilados pelos personagens, ou produzir os mais fragorosos ruídos com os mesmos, resultando assim num riquíssimo jogo de sinfonias e cacofonias de belezas e estranhamentos sonoros.

Uma gigantesca preciosidade concentrada em compactos 66 minutos de duração.