GRATUITO, FESTIVAL ITALIANO TRAZ O BELO “A SOMBRA DE CARAVAGGIO”.

Por Celso Sabadin

Me acostumei a ver Michele Placido nos anos 1980, como ator, em filmes como Três Irmãos, Fontamara e Os Poderes de Máfia, entre outros. Naquela época, eu passava os finais de semana no eixo da Avenida Paulista, saltando de uma sessão de cinema para outra.  

Não sabia que, a partir de 1990, ele também havia se tornado diretor. Minha ignorância advém do fato de ser bastante falha e esparsa a distribuição de filmes italianos no Brasil. Felizmente, iniciativas como este Festival do Cinema Italiano suprem – pelo menos em parte – tal lacuna.  

Graças ao evento, tive a chance de conferir agora um pouco deste Placido diretor em A Sombra de Caravaggio. Com um belo atraso, é certo, pois trata-se do 18º longa dirigido por ele. Não me decepcionei.  

A partir do roteiro de Sandro Petraglia, Fidel Signorile e do próprio diretor, Placido conta a história do pintor renascentista Michelangelo Merisi (interpretado com vigor por Riccardo Scamarcio), muito mais conhecido como Caravaggio. O apelido vem da cidade onde ele nasceu.

Quebrando a clássica ordem cronológica, a ação se inicia com a igreja empreendendo uma feroz investigação contra o artista. Motivo: ele teria utilizado prostitutas representando a virgem Maria como modelos em seus quadros sacros, uma “heresia” que a hipocrisia católica não poderia permitir. A tarefa é entregue ao inquisidor Ombra (não por acaso, “sombra” em italiano), vivido no filme por Louis Garrel.

A investigação será conduzida, segundo as próprias palavras de Ombra, “pela cruz e pela espada”, ratificando assim o binômio de ódio e horror que norteou a igreja naquela época. E talvez não só naquela.

Inicialmente um tanto solene e didático demais, o filme demora um pouco a encontrar um registro mais fluido para sua narrativa, mas quem se dispuser a enfrentar tais momentos iniciais será bastante recompensado. Não apenas pela sua caprichadíssima produção, ou pela sua bela fotografia em tons bronze e laranja (que, como não poderia deixar de ser, mimetiza a obra do biografado), mas principalmente pelo encorpamento consistente e gradativo de seus protagonistas, o que faz deslanchar sua forte dramaturgia.

A discussão central reside sobre o eterno conflito entre o sagrado e o profano, sobre a (falta de) liberdade artística dentro de um sistema financiado pela igreja, e principalmente sobre a hipócrita perseguição a um homem simples que se vê punido pelos poderosos exatamente por causa de sua ingênua intenção de louvar o deus em que crê.

E ainda há espaço para uma participação de luxo da sempre ótima Isabelle Huppert. Ah, não havia reconhecido, mas o próprio Michele Placido compõe o elenco, no papel do Cardeal Del Monte.

Coprodução franco-italiana, A Sombra de Caravaggio foi indicado a quatro prêmios David Di Donatello (o principal da Itália), e faz parte da programação do 18º Festival do Cinema Italiano. O longa pode ser visto presencialmente em uma das várias cidades brasileiras que participam do evento, ou online, gratuitamente.

Todas as informações então em https://festivalcinemaitaliano.com