HANEKE DESTRINCHA A MALDADE HUMANA EM “A FITA BRANCA”.

Um dos grandes nomes cinematográficos dos últimos anos, o bávaro Michael Haneke vem construindo sua obra sobre o binômio crueza/crueldade. De narrativa crua e visceral, seus filmes não usam meias palavras para abordar diversas facetas da crueldade humana. Haneke sabe como filmar e como perturbar, como já ficou largamente comprovado em “Código Desconhecido”, “Violência Gratuita” (versões de 1997 e 2007), “A Professora de Piano” ou “Cachê“. Agora, em “A Fita Branca”, o roteirista e diretor ratifica uma vez mais seu foco.

No início do século 20, os habitantes de uma pequena e conservadora aldeia servem como um microcosmo da falência das relações humanas e sociais. O lugar é capitaneado por um poderoso barão e sua bela baronesa, cujas fazendas empregam boa parte da vila. O respeitável médico local, viúvo, mantém uma relação doentia com uma parteira que, por sua vez, tem um filho cuja deficiência mental levanta suspeitas sobre sua concepção. A poucas ruas dali, o sisudo pastor educa seus filhos a chibatadas. Filhos que, unidos a outros coleguinhas da escola, formam um grupo de crianças tão assustadas quanto assustadoras. Todas elas são alunas de um jovem professor que parece ser a única voz equilibrada do lugar. O que não é exatamente confiável, posto que toda a história é narrada por ele que, desta forma, conta o que melhor lhe convier. No curto período de apenas alguns meses, acidentes e atrocidades começam a abalar o vilarejo. Igreja, poder, infância, sociedade, família, tudo parece ruir, como que preparando o cenário para uma catástrofe bem maior – esta de proporções mundiais – que estava prestes a acontecer.

Quase não há bondade ou redenção no universo de Haneke. Apenas seres humanos perturbados e aprisionados por convenções sociais que eles próprios criaram para si. Valores regidos pelo medo, individualidade, e descaso (quando não repulsa) ao seu igual.

Como que sublinhando ainda mais a crueza da situação, Haneke filma num magnífico e brilhante preto e banco. Constroi planos meticulosamente preciosos e surpreende a plateia tanto por aquilo que a historia conta, mas também pelo que não conta, que apenas sugere, instiga. Escorrega apenas no uso algumas vezes excessivo da narração em off explicativa, que não condiz com a genialidade das imagens que compõe. Defeito que não tira os méritos dos vários prêmios que “A Fita Branca” vem acumulando. Entre eles, nada menos que a Palma de Ouro em Cannes e o Globo de Ouro de filme estrangeiro.