INÉDITO NO BRASIL, OSCAR DE 1933 CHEGA AO DVD.

Pacifista e moralista, "Cavalcade" levou as estatuetas de Filme e Direção.

 

Por Celso Sabadin.

Se você faz parte do time das pessoas que acham que “este mundo está perdido”, que não é mais possível aguentar tanta imoralidade, corrupção, guerras e falta de Deus, uma notícia: isto não é exatamente uma novidade. Muita gente já achava exatamente a mesma coisa há mais de 80 anos, exatamente em 1933, conforme pode ser visto no perturbador “Cavalgada”, lançado em DVD pelo selo Obras Primas.

Antes de mais nada, trata-se de um lançamento histórico: grande vencedor do Oscar de 1934, onde ganhou os prêmios de Melhor Filme e Melhor Direção, “Cavalgada” nunca havia sido lançado em home vídeo no Brasil, e ganha agora uma edição das mais dignas, com ótima imagem, embalagem caprichada e até um pequeno porém charmoso extra. A partir da peça do renomado dramaturgo inglês Noël Coward, o diretor escocês Frank Loyd (de “O Grande Motim“) conta mais de três décadas de história de duas famílias britânicas: os aristocratas Marryots e seus empregados, os Bridges. A saga começa no réveillon de 1899 e se prolonga até o réveillon de 1932, passando pelos mais significativos eventos históricos do período, com ênfase na Primeira Guerra Mundial que, na época, obviamente, não era denominada como “Primeira”, posto que ainda não acontecera a Segunda.

Ao mesmo tempo em que prega a paz e condena a imbecilidade das guerras, “Cavalcade” também exibe um lado conservador e moralista, principalmente ao mostrar que os Bridges, enquanto empregados, eram “felizes” em sua mediocridade, mas se afundam ao tentar quebrar o vínculo patronal. “Liberdade em demasia não é bom”, chega a dizer um personagem. Da mesma forma, os filhos dos Marryots seguem carreiras “respeitáveis”, enquanto a filha dos Bridges “se perde” na profissão de dançarina, com todo o preconceito típico da época. De qualquer maneira, é notável também a maneira como o filme expõe a ingenuidade patriótica dos jovens que se alistam para os campos de batalha como se fossem participar de uma festa. Há até comemorações nas ruas quando a Inglaterra declara guerra à Alemanha.  O contraponto vem na belíssima cena onde o canto supostamente glorioso dos soldados vai arrefecendo e dando lugar às mortes na medida em que passam as cartelas com os anos da Guerra.

O final (não é spoiler) é de dar nó na garganta: abatidos pela vida, os Marryots erguem um brinde “à dignidade, à grandeza e à paz”. Sem saber que, seis anos depois, o mundo mergulharia num novo e sangrento conflito mundial. O mesmo conflito que colocaria na lista negra o dramaturgo Noël Coward, homossexual assumido, num trágico e sórdido círculo vicioso de horror.