“INVICTUS” É MAIS UM SHOW DE CINEMA DE CLINT EASTWOOD.

Na vida real, esporte e política sempre caminharam lado a lado. É só lembrar, por exemplo, dos esforços de Hitler para tentar provar a tal “supremacia ariana”, durante as Olimpíadas pré-Segunda Guerra. Ou da exploração da imagem da seleção brasileira de futebol durante a ditadura Médici em 1970 (idem Argentina em 78), ou ainda do atentado contra atletas judeus nas Olimpíadas de Munique. Isso apenas para citar alguns exemplos. No cinema, porém, talvez nunca o tema tenha sido abordado com tanto talento e emotividade como em “Invictus’, o mais recente trabalho do veterano (e cada vez melhor) Clint Eastwood.

Não é um filme sobre rúgbi. Não é um filme sobre Nelson Mandela. “Invictus” é sobre a possibilidade da igualdade entre as raças e as condições sociais. Da união entre diferentes. Da tolerância. Enfim, de todas estas maravilhosas utopias que amamos acreditar.

A partir do livro “Playing the Enemy: Nelson Mandela and the Game that Made a Nation”, escrito por John Carlin, o roteiro do sul-africano Anthony Peckhan (também co-roteirista de “Sherlock Holmes”) mostra Nelson Mandela assumindo a presidência da África do Sul, após décadas de cativeiro. O caos domina o país. Violência, desemprego, pobreza, desvalorização da moeda e – pior – um ódio racista que permeia bancos e negros recém-saídos do abominável regime do Apartheid que transformou a África do Sul em vergonha mundial.

Em meio ao ódio, Mandela (Morgan Freeman, perfeito para o papel) cria uma política do perdão. “O perdão remove o medo, por isso é uma arma tão poderosa”, ele prega. Sua proposta é “supreender o inimigo com tudo o que eles nos negaram”. Mas a maior surpresa dos primeiros dias do novo governo é que, atolado em todos os tipos de problemas, o Presidente prefere dar prioridade à seleção sul-africana de rúgbi, prestes a disputar a Copa do Mundo deste esporte tão estranho aos nossos olhos sul-americanos. A decisão parece absurda, mesmo porque ele sequer é fã do esporte. Mas Mandela tem um plano: ele visualiza naquele jogo o fator que pode integrar a nação desfaçelada, o elo que pode unir bancos e negros… ou a pátria de chuteiras, como disse Nelson Rodrigues.
Esta história real é dirigida por Clint Eastwood (que completará 80 anos em maio próximo) dentro de seu consagrado e tradicional estilo: narrativa clara, câmera clássica, muita sobriedade, estética limpa e convencional, sempre extraindo o máximo de seu elenco e da história que ele tem para contar. E como conta bem! Os personagens são construídos com veracidade e vigor bem diante dos nossos olhos, em poucos minutos. A empatia criada com a plateia é intensa. A trama flui, sem tempos mortos, mesclando tensões e humor em doses equilibradas.
Claro, sempre há as armadilhas sentimentais de praxe, como usar e abusar da câmera lenta nos momentos decisivos do jogo, ou compor canções românticas feitas sob medida para serem indicadas ao Oscar. Mas nada que tire os méritos deste grande diretor e deste grande filme: quando chegam as decisivas cenas finais, já estamos todos profundamente imersos na tela. Fomos pegos mais uma vez pelo talento de um excepcional contador de histórias cinematográficas.

Tem sido cada vez mais prazeroso esperar pelo “novo filme de Clint Eastwood”.