JAIR RODRIGUES ENCANTA COMO ATOR EM “SUPER NADA”.

Depois de Moacyr Franco roubar a cena em “O Palhaço”, agora outro ícone popular dos anos 1960/70 brilha no cinema brasileiro: Jair Rodrigues. Mais que coadjuvar, o famoso intérprete de “Disparada” vive o papel título de “Super Nada”, de Rubens Rewald (não confundir com o quase homônimo crítico de cinema).

“Super Nada” investiga e desmistifica o universo da profissão de ator pelo ponto de vista de Guto (Marat Descartes, ótimo). Fazendo locução para comerciais, participando de “pegadinhas” em programas populares de televisão, ou atuando como palhaço em pequenos teatros, Guto luta como pode para tentar sobreviver, com alguma dignidade, da sua – tão difícil – profissão. Até que surge aquilo que ele considera “o teste de sua vida”: atuar no programa humorístico de TV “Super Nada”, ao lado de um velho palhaço que foi ídolo de sua infância. O fato é tão importante para Guto que, num primeiro momento, o filme se chamaria “Teste”.

“Super Nada” exala uma decadência presente em todos os detalhes e sub-tramas. Fazem parte da vida do protagonista um sofá de pé quebrado, um engradado plástico que serve de mesa de TV, um parceiro de trabalho que ama e odeia na mesma intensidade, e uma namorada bipolar. Não é pouco. Estruturalmente, o filme se assemelha ao seu personagem principal: derivativo em excesso em alguns momentos, poético em outros, eventualmente surpreendente, mas sempre mantendo um certo charme de patética decadência. Tematicamente, “Super Nada” apresenta pontos em comum com o também ótimo “Riscado”.
Dizer que Marat Descartes é um grande ator (aliás, como eu já disse neste texto) é chover no molhado, e aqui o papel parece ter sido feito sob medida para ele. A maior surpresa, porém, fica por conta do veterano cantor Jair Rodrigues vivendo convincentemente um velho palhaço cujo mote de vida é “Não tá fácil pra ninguém”.

Rewald diz a “Preview” que a escolha de Jair mudou o filme. “Confesso que não foi fácil dirigi-lo. O homem é free style total, improvisa sempre, nunca um take é igual ao outro. Por outro lado, é uma explosão de talento e carisma. No roteiro, o personagem era mais amargo, e depressivo, mas isso seria impossível com o Jair. Ele trouxe uma luz, uma alegria, e reformatou o filme. Todos saímos ganhando”, diz o cineasta.

A ideia de um ator tentando ansiosamente provar a si mesmo que é capaz de viver pelos seus próprios esforços extrapola o universo das artes. “Comecei a observar que eu próprio, amigos meus, psicólogos, arquitetos, cineastas, acadêmicos, todos vivemos esta ansiedade da eterna competição. Somos todos Gutos”, finaliza Rewald.

Texto de Celso Sabadin originalmente publicado na Revista Preview.