JUVENIS “CONTOS DO AMANHÔ.

Por Celso Sabadin.

Em determinadas cenas de “Contos do Amanhã”, ouve-se algum personagem dizer: “Isso não faz sentido”. Guarde a frase com atenção. Talvez ela seja uma autocrítica, ou talvez a própria chave de acesso para a compreensão do filme.
Posicionado pelos seus próprios realizadores como aventura adolescente, “Contos do Amanhã” é uma ficção científica juvenil ambientada em dois tempos que caminham em alternâncias paralelas: os anos 1999 e 2165.
No primeiro tempo/espaço, acompanhamos Jeferson (Bruno Barcelos), um adolescente que tenta decifrar enigmáticas mensagens recebidas através do seu velho computador 286 de conexão discada. Perturbado pelo mistério, ele mal percebe as duas garotas da escola que disputam a sua atenção. Na segunda ambientação, temos a eterna distopia do mundo altamente tecnológico à beira da destruição que busca no elemento humano a sua provável única salvação.
O resultado é um filme difícil de ser analisado em poucas palavras. Não exatamente pela sua complexidade, mas principalmente pelas suas singulares irregularidades. Da mesma forma que o roteiro propõe as citadas alternâncias espaço-temporais, o longa em si expõe abissais discrepâncias qualitativas como, por exemplo, entre a ótima construção do personagem principal de 1999 – e a respectiva interpretação de seu jovem ator – em contraposição às constrangedoras performances dos vilões de 2165. “Isso não faz sentido”, pensa-se. Ou tal estranhamento distópico teria sido exatamente a ideia do filme?
Da mesma forma, alternam-se inspirados momentos de concepções visuais artístico-urbano-futuristas com outros que se assemelham a telenovelas da Record, o que potencializa ainda mais as sensações de discrepâncias que nos tomam durante a projeção. Talvez seja uma crítica irônica à destruição da sociedade imaginada pelo roteiro, posto que o humor também está presente no filme: afinal, uma das pouquíssimas mega cidades-estado que sobreviverão em 2165 se chama Porto 01. Lembrando que o filme tem “nacionalidade” gaúcha.

Sarcástico ou não, “Contos do Amanhã” é coerente com o público que busca, ao surfar com desenvoltura e com uma doce irresponsabilidade pela ousadia juvenil. Apresenta qualidades em sua jornada futurista, ao mesmo tempo em que se apoia na grande muleta histórica do cinema brasileiro: o excesso de verbalização, em detrimento ao uso da linguagem cinematográfica para o desenvolvimento de sua dramaturgia.

O filme marca a estreia em longas ficcionais de Pedro de Lima Marques, realizador do curta “Cubos”, do programa semanal “Galera de Atitude” (TVE-RS) e das séries documentais “Vida Fluxo” e “Teatro de Rua (R)Existe”.

A produção informa que o filme chega aos cinemas brasileiros em 9 de dezembro, depois de colecionar 27 seleções e 15 prêmios em festivais de cinema de gênero em 12 países, incluindo o Boston Sci-fi Film Festival.