“KÁTIA”, DIRETO E DESPOJADO COMO SEU PERSONAGEM.

O universo LGTB tem sido o foco de muitos documentários brasileiros recentemente, tanto de curta como de longa metragem. É uma espécie de grito dos excluídos chegando também às telas. Nada mais justo neste momento em que a homossexualidade, em suas mais diversas facetas, tem sido discutida em patamares jamais imaginados há até alguns anos.

É neste cenário que entra em cartaz o documentário “Kátia”, dirigido por Karla Holanda. A personagem que batiza o filme é Kátia Tapety, a primeira travesti a se eleger a um cargo político no Brasil: foi vereadora três vezes e vice-prefeita no interior do Piauí.
Estruturalmente, trata-se de um filme bastante simples. A equipe de filmagem conviveu durante 20 dias com a personagem, registrando seu dia-a-dia de forma próxima e afetiva. A câmera de Karla corre solta pelo entorno do mundo de Kátia, revelando tanto a precariedade como a espontaneidade de seu universo. Depoimentos de conhecidos, familiares e até de desconhecidos (há uma cena impagável com o dono de uma loja de roupas no Rio de Janeiro, onde Kátia pede desconto por um maiô) recheiam
a narrativa.
É digno de nota um depoimento de uma prima de Kátia que afirma não haver discriminação nem preconceitos em sua região que, segundo ela, é carregada de uma forte dose de religiosidade que faz com que todos ali se tratem de forma igual. Enquanto ela afirma tão improvável assertiva, a câmera se desloca e revela, na parede de sua casa, um cartaz de propaganda política pró-PSDB. Como contraponto, Kátia afirma, com todas as letras, que seu pai vivia dizendo que os homossexuais deveriam ser mortos.

O documentário também resvala nas relações entre documentarista e documentados, escancarado a la Eduardo Coutinho as diferentes reações de quem de repente se vê diante de uma câmera. Há quem faça discursos políticos, há quem se envergonhe, há quem se constranja e quem se orgulhe neste fascinante jogo áudio visual.

“Kátia” é um filme direto e despojado, como a própria personagem que se propôs a retratar.