“LISPECTORANTE” E “VIRGÍNIA E ADELAIDE” RESGATAM PASSADOS BRASILEIROS.

Por Celso Sabadin.

Esta quinta-feira, 8 de maio, está recheada de filmes brasileiros chegando ao nosso circuito exibidor. Além de “Inventário de imagens perdidas”, “Criaturas da Mente”, “Memórias de um Esclerosado” (todos que eu ainda não vi) e “Betânia” (leia crítica em https://www.planetatela.com.br/critica/o-encantador-e-desconhecido-maranhao-de-betania/), estreiam também os instigantes “Lispectorante” e “Virgínia e Adelaide”.

 

LISPECTORANTE

Aplaudida pelas suas direções nos premiados “Amor, Plástico e Barulho” e “Carro Rei”, a pernambucana Renata Pinheiro retorna com “Lispectorante”, uma homenagem à escritora ucraniana radicada no Brasil Clarice Lispector.

O roteiro – dela mesma em parceria com Sergio Oliveira – trafega com desenvoltura entre realidade e fantasia, através da personagem Glória, interpretada pela sempre ótima Marcélia Cartaxo. Ela vive uma artista que desistiu de sua arte, e retorna à sua Recife natal, onde se hospeda na casa de uma tia. Flanando pelas ruas da cidade, depara-se com antigas memórias, personagens excêntricos, com uma estátua de Clarice, e com um enigmático casarão abandonado. As lembranças de Recife acendem em Glória sonhos enigmáticos que dialogam com passados simbólicos e futuros distópicos.

Tangencialmente, Marcélia esbarra com Grace Passô, o que provoca na tela uma intensa centelha de concentração de talentos ocasionada por esta rara conjunção de estrelas deslumbrantes.

O elenco ainda tem Pedro Wagner, Fatima Aguiar, Karina Buhr, Brenda Lígia e Nivaldo Nascimento, entre outros.

0000000000000000000000000000000000000virgnia_f04cor_2024112987

“VIRGÍNIA E ADELAIDE”

Se “Lispectorante” tem Marcélia Cartaxo e Grace Passô, “Virgínia e Adelaide” tem Gabriela Correa e Sophie Charlotte. Elas interpretam as personagens do título, baseadas nas vidas reais de Virgínia Bicudo e Adelaide Koch.

Virgínia foi a primeira psicanalista brasileira, e também a primeira pessoa negra – independente de gênero – a obter reconhecimento em sua área de atuação, no Brasil. Sophie foi uma psicanalista alemã que reconstruiu sua carreira no Brasil, após fugir do nazismo em sua terra natal.

Ambas mantêm, num primeiro momento, um relacionamento de analista/paciente, que depois evolui para uma intensa e duradoura amizade. Tudo isso durante a ditadura Vargas no período do Estado Novo, a partir de 1937.

Mas, atenção! Logo no início do filme um letreiro avisa que as personagens são reais, e todo o resto é ficção. Não por acaso, a advertência imediatamente me fez lembrar dos créditos finais de “Ilha das Flores”: tanto o longa que estreia agora como o curta clássico têm roteiro de Jorge Furtado. O ótimo diretor de “Saneamento Básico” e “Meu Tio Matou um Cara”, entre outros, também é codiretor de “Virgínia e Adelaide”, em parceria com Yasmin Thainá.

 

Apoiando-se em bons diálogos e algumas ferramentas mais identificadas com a linguagem teatral, “Virgínia e Adelaide” abre interessantes, pertinentes e atuais discussões, como racismo,  sexismo, ditaduras, e outras mazelas humanas que – infelizmente – parecem nunca sair da pauta.