“MUNDO NOVO” E A QUESTÃO DO LUGAR DE FALA.

Por Celso Sabadin.

Começo este texto com uma pequena provocação. Ou um questionamento polêmico, chamem como quiser. Seguinte: vocês assistiriam, nos dias de hoje, a um filme cujo tema principal é o racismo estrutural na sociedade brasileira, se ele fosse escrito, dirigido, e majoritariamente produzido por profissionais brancos?

O filme em questão é “Mundo Novo”, que estreou nesta quinta-feira (23/05) exclusivamente no Espaço Augusta (novo nome do ex-Espaço Itaú, depois que o banco pulou fora do patrocínio). Ele é escrito e dirigido por Álvaro Campos, e produzido pela Coqueirão Pictures (do Diogo Dahl), em coprodução com a Vilania Ficcional (do mesmo Álvaro Campos) e da Video Filmes (dos irmãos Salles, herdeiros do Itaú). E para não dizer que eu não falei de cotas, o Grupo Nós do Morro – este formado por pessoas negras – também coproduz.

A trama fala de Conceição (Tati Vilela) e Marcelo (Nino Batista), um casal que pretende comprar um apartamento no Leblon, mas para isso precisa da ajuda de Charles (Kadu Batista), irmão de Marcelo. Conceição é negra, e tem uma profissão “validada” pela elite: ela é advogada. Marcelo é branco, e é marginalizado por esta mesma classe dominante por ser “artista”. E Charles é o dono do dinheiro.

As tensas negociações entre estes três protagonistas abrem diversos caminhos de hipocrisia que vão misturar relações familiares, preconceitos sociais e, claro, raciais.

Existe um motivo pelo qual “Mundo Novo” tenha uma pegada mais teatral que cinematográfica: ele foi filmado integralmente no morro do Vidigal, isolando seus protagonistas ao longo da pandemia de Covid-19, e explorando o ponto de vista da comunidade do Vidigal.

No Festival do Rio de 2021, “Mundo Novo” ganhou os prêmios de Melhor Roteiro, e Melhor Atriz, para Tati Villela.

Sobre a questão do tão discutido “lugar de fala”, fica o questionamento. Eu tampouco tenho as respostas.