NOVO ESPISÓDIO DE “AS CRÔNICAS DE NÁRNIA” MISTURA AVENTURA E CRISTIANISMO.

Os fãs já sabem: quem cresce, não pode voltar a Nárnia, o reino mágico cujas portas somente são franqueadas aos garotos e garotas que mantêm acesa a chama da fantasia. Os irmãos maiores Pedro e Susana, presentes nos dois primeiros filmes, já “passaram a bola” para os caçulas Edmundo e Lúcia. São eles agora os responsáveis pelo terceiro episódio da cinessérie “As Crônicas de Nárnia”, batizado como “A Viagem do Peregrino da Alvorada”. Na verdade, um terceiro e importante elemento será incorporado a esta nova aventura: o primo pentelho Eustáquio (o ótimo Will Pouter), que junto com Edmundo e Lúcia é tragado para Nárnia por meio de um quadro na parede. Os três caem no reino mágico bem ao lado do barco do Príncipe Cáspian, que não consegue entender o motivo de tão inesperada visita: afinal, reina a paz em Nárnia, e a presença dos reis Eduardo e Lúcia parece totalmente desnecessária. Parece. Logo nossos aventureiros navegadores vão perceber que a tão sonhada Paz não é tão fácil assim de se manter, já que eles terão de percorrer os traiçoeiros caminhos de cinco misteriosas ilhas para encontrar as espadas encantadas dos sete Lordes de Telmar. Não é mole, não.

Este novo filme se baseia no terceiro livro de um total de sete da saga de C. S. Lewis, publicada pela primeira vez entre 1950 e 1956. Originalmente publicado em 1952, “A Viagem do Peregrino da Alvorada” se passa três anos depois do livro anterior, “Príncipe Cáspian”.
Desta vez o diretor não é mais Andrew Adamson, como nos dois primeiros episódios, mas sim o premiado inglês Michael Apted, o mesmo de “007 – O Mundo Não é o Bastante”, “Nas Montanhas dos Gorilas” e “O Destino Mudou sua Vida”, para citar alguns exemplos. Adamson assina agora como produtor.

Novamente aqui se percebem os elementos da cultura católica-cristã que permeiam a obra de Lewis. São bem claras as questões da tentação, dos pecados capitais que assombram os protagonistas (como o Orgulho e a Ira de Edmundo, que quer ser Rei, e a Vaidade de Lúcia, que deseja ser tão bonita quando a irmã), e principalmente da forte presença de Aslam como um deus todo poderoso, onipresente e onisciente, senhor de um reino do qual não se poderá retornar, uma vez visitado. Felizmente, nada no filme é colocado de forma catequética.
Como aventura, “A Viagem do Peregrino da Alvorada” cumpre o que promete. A direção de Apted imprime um bom ritmo de ação, sem escorregar na tentação fácil de transformar o filme num videogame, ao mesmo tempo em que elabora com níveis satisfatórios de tensão e mistério os ingredientes mágicos e místicos indispensáveis ao gênero. Tudo temperado com o delicioso senso de humor irônico e sarcástico típico dos britânicos.
Para os olhos mais atentos, algumas cenas podem parecer excessivamente digitais, mas nada que uma boa dose de fantasia não releve.

“A Viagem do Peregrino da Alvorada” ainda resolve, com muita competência, o problema da “passagem de bastão” dos protagonistas. Explicando: como no próximo filme será Eustáquio o personagem a comandar a ação, e não mais Edmundo e Lúcia, o roteiro deste terceiro capítulo tinha a importante missão de apresentar aos fãs o nascimento deste novo “herói”, com carisma e credibilidade suficientes para que a saga pudesse continuar sem sobressaltos. E conseguiu. O arco dramático de Eustáquio é dos mais convincentes, e sua “transformação” (no caso, até literalmente) já o credencia a assumir a continuidade da franquia.

A lamentar apenas, e mais uma vez, o fato do sistema 3D ser usado aqui somente de forma mercadológica e publicitária: praticamente não existem cenas neste “A Viagem do Peregrino da Alvorada” que justifiquem o preço cobrado pelo ingresso 3D. Que, além de tudo, rouba luz e cores da bela fotografia do filme. Deveria existir algo no código de defesa do consumidor que proibisse esse tipo de manobra. Será que não existe?

Uma curiosidade final: mesmo na era digital, a cenografia, digamos, “braçal”, ainda é insuperável. O belíssimo navio Peregrino da Alvorada, que dá título ao filme, foi efetivamente construído. Ele tem
43 metros de comprimento, pesa 125 toneladas, e é desmontável em mais de 50 partes, para que pudesse ser utilizado tanto em locações como em estúdio.

Sim, ainda existem pregos e martelos em Hollywood.