NOVO “PINÓQUIO” É ENCANTADOR.

Por Celso Sabadin.

Antes de mais nada, vale o esclarecimento: Pinóquio não é, nunca foi e jamais será um personagem da Disney, contrariamente ao que muitos ainda pensam. Nem Branca de Neve, nem Cinderela, nem O Rei Leão, nem Bambi, nem A Pequena Sereia, etc etc etc… O grande mérito da Disney foi popularizar estes e tantos outros personagens através de suas animações de longa metragem (mesmo com fortes doses de adaptações, concessões e licenças poéticas cometidas sobre as histórias originais).

Feito o esclarecimento, vamos aos fatos. Pinocchio (nome derivado de “occhi di pino”, ou “olhos de pinho”) surge pela primeira vez em 1883 como um dos personagens do “Giornale per i bambini”, um periódico voltado para o público infantil. Foi neste jornal que o escritor e jornalista Carlo Collodi (pseudônimo de Carlo Lorenzini) publicou, em capítulos, a sua “Storia di un burattino” (História de um Boneco), mais tarde rebatizada como “Aventuras de Pinóquio”.

Apenas 16 anos após a invenção do cinema, foi realizada a primeira adaptação cinematográfica da história de Collodi: o quase longa (50 minutos) “Pinnochio”, live-action dirigido por Giulio Antamoro e produzido pela Società Italiana Cines, em 1911. Ainda é possível encontrar fragmentos deste filme disponíveis na internet.

Outras adaptações vieram, entre elas a versão mais famosa da Disney, de 1940; a produção europeia “As Aventuras de Pinocchio”, com Martin Landau vivendo Gepetto; e um desastroso “Pinocchio” de 2002, superprodução italiana dirigida e interpretada por Roberto Benigni, que naufragou nas bilheterias e na crítica.

Tudo isso para dizer que estreia nesta quinta-feira, 21 de janeiro, mais uma versão cinematográfica do boneco de madeira que virou símbolo de político brasileiro mentiroso: o “Pinóquio” de

Matteo Garrone (o mesmo de “Gomorra’ e “Dogman”), uma produção ítalo-franco-britânica. Roberto Benigni está novamente no projeto, mas desta vez não mais vivendo o personagem título (ufa!), mas sim o simpático Gepetto.

Sugiro que nos esqueçamos pelo menos por duas horas que todos nós pegamos um ranço enorme do histriônico Benigni (depois que ele pulou feito um doido por cima das poltronas para receber das mãos de Sophia Loren o Oscar de filme estrangeiro que deveria ser de “Central do Brasil”) e vamos curtir o filme. Ele merece.

Este novo “Pinóquio” começa mostrando o solitário marceneiro Gepetto que, sonhando ser pai, acaba esculpindo o boneco Pinóquio (Federico Ielapi) a partir de um tronco de madeira mágica que um vizinho lhe empresta. Criando vida o boneco, ele imediatamente se mune de uma energia curiosa tão interminável quanto irresponsável, o que provocará as mais diversas provações ao seu criador.

O longa está sendo anunciado como a mais fiel adaptação cinematográfica da obra de Collodi. Particularmente, não saberia dizer, pois infelizmente não li o original. Mas, independente de sua fidelidade, o longa é encantador. Caprichadíssimo em todos os seus aspectos visuais (direção de arte, fotografia, vestuário, maquiagem etc), ele mantém a magia que se espera de um filme baseado em um conto fantástico, ao mesmo tempo em que não demonstra – ao contrário de sua versão mais famosa – a preocupação em edulcorar as passagens que exigem maior dramaticidade. Não decepciona quem busca as referências básicas da animação dos anos 40, ao mesmo tempo em que se abre para novas intepretações de antigos valores, como verdade, fidelidade e paternidade.

E para quem acha que o assunto Pinóquio terminou, Guillermo del Toro já está dirigindo e a Netflix já está produzindo uma animação em stop motion do conto de Collodi, provando mais uma vez que o que é clássico nunca morre.