“O CONCERTO” É UM DOS MELHORES FILMES DE 2010.

O cineasta romeno Radu Mihaileanu conseguiu de novo. Depois de escrever e dirigir um dos melhores filmes dos anos 90 – “O Trem da Vida” – Radu apresenta seu genial “O Concerto”, filme coproduzido por nada menos que cinco países: França, Itália, Bélgica, Rússia e Romênia. Um verdadeiro “tour de force” europeu que traz como tema exatamente as aventuras, desventuras, ironias, dramas e comédias de tornar a União Europeia uma efetiva… união.

A idéia original é de Héctor Cabello Reyes e Thierry Degrandi, praticamente dois desconhecidos no mercado cinematográfico. Eles desenvolveram a incrível história de Andrey (Alekesey Guskov), famoso maestro da antiga União Soviética que, por motivos que só saberemos ao final do filme, caiu em desgraça com o então todo poderoso premiê Leonid Brejnev, e hoje é apenas um faxineiro do Teatro Bolshoi, em Moscou. Tudo caminha melancolicamente na vida de Andrey, até o dia em que ele acidentalmente intercepta um fax encaminhado ao diretor do Teatro, solicitando a contratação da orquestra do Bolshoi para uma apresentação de gala no conceituado Teatro Châtelet de Paris. É a chance de sua vida! Sem imaginar as consequências, o ex-maestro decide enganar o verdadeiro Bolshoi, e ele próprio se apresentar na capital francesa. Mas para isso ele terá de montar uma orquestra inteira… em 15 dias.

Assim tem início uma louca, divertida e satírica empreitada bastante parecida por sinal com a doce maluquice da proposta básica de “O Trem da Vida”: criar uma grande farsa para iludir e tirar proveito dos aproveitadores do poder. Em ambos os casos, de ambos os filmes, o humor e o imponderável estão a cargo do sarcasmo social. Mais do que formar uma orquestra de Brancaleone, o grande maestro na verdade rege aqui a própria identidade europeia, multifacetada, fragmentada, mas com talento e garra suficientes para criar uma união que – talvez – traga benefícios a todas estas pequenas e enraizadas culturas que se convencionou chamar de Europa. Uma fragmentação que encontra na perfeita sintonia obtida num concerto erudito sua mais fiel analogia.

E mais: o filme é um verdadeiro resgate da dignidade russa pós esfacelamento da União Soviética. Num primeiro momento, a título de comédia, “O Concerto” parece até exagerar na dose de preconceitos contra os eslavos, pintando-os como embriagados e irresponsáveis. Aos poucos, porém, percebe-se que Mihaileanu está apenas carregando de forma proposital nas tintas da maquiagem do palhaço, para nos momentos finais revelar toda a beleza e o poder de recuperação desta cultura tão grandiosa que foi por décadas ridicularizada pela Guerra Fria, pelos donos da mídia ocidental, e pela incompetência de vários de seus próprios dirigentes políticos.

Tudo isso com um humor encantador, um ótimo ritmo de comédia, e um belo roteiro que guarda boas surpresas para o final. Indicado a quatro prêmios César (ganhou os de Som e Trilha Sonora) e ao Globo de Ouro de melhor filme em língua não inglesa, “O Concerto” é um dos melhores filmes que vimos no circuito comercial brasileiro em 2010.