“O DESMONTE DO MONTE”, OU COMO A GANÂNCIA REMOVE MONTANHAS.

Por Celso Sabadin.

“O Desmonte do Monte” é um documentário sobre o desmantelamento do Morro do Castelo, no Rio de Janeiro, uma megaintervenção urbana que durou décadas e possibilitou a abertura de modernas e espaçosas avenidas na então capital federal. É, pode ser. Mas o filme é muito mais que isso. Muito mais!

Com pesquisa, roteiro e direção de Sinai Sganzerla, uma das filhas do histórico cineasta Rogério Sganzerla, “O Desmonte do Monte” é uma importantíssima aula de História do Brasil. Tendo o Morro do Castelo como mote, o longa na verdade é um retrato do congênito e incurável mau-caratismo das classes dominantes brasileiras, que não nunca hesitam em destruir tudo o que há pela frente para fazer prevalecer seus interesses financeiros. Se algo se interpõe no caminho das elites rumo às suas inesgotáveis ganâncias, este algo deve ser eliminado.  Sejam montanhas ou seres humanos, tanto faz.

O filme busca já no século 16 as raízes dos mecanismos que unem os donos do poder (governos, igrejas, empresários, exércitos) contra populações que por ventura estejam em seus caminhos de enriquecimento. Foca depois na saga do Morro do Castelo de São Sebastião, marco inicial da cidade do Rio de Janeiro, a respeito do qual se erguem lendas sobre tesouros inesgotáveis escondidos em suas entranhas. Discorre com clareza sobre os motivos reais do seu desmanche (empreiteiras, claro!) e liga os fatos históricos com a recente gentrificação carioca por ocasião das Olimpíadas. Ou seja, novamente escancara as roubadas em que o povo brasileiro se mete por total desconhecimentos de sua própria História. Fica aquela amarga sensação que há séculos nada muda neste país e – pior – nem mudará.

Tudo com uma linguagem clara, acessível, até didática (no bom sentido da palavra), e uma extraordinária pesquisa de imagens que desmente a velha assertiva que o Brasil não tem memória. Tem, sim, mas parece que tem preguiça de procurar. O que acaba gerando um enorme desconhecimento histórico que, de tempos em tempos, nos mete a todos em encrencas já vividas em outros tempos.

Obrigatório e imperdível, “O Desmonte do Monte” estreia em 28 de junho.