O ELEGANTE “TRAMA FANTASMA” E AS MÁSCARAS DE TODOS NÓS.

Por Celso Sabadin.

A “trama” de “Trama Fantasma” não é a do sentido dramatúrgico, do desenrolar dos fatos. E o “Fantasma” também não é daquele tipo que nos acostumamos a ver em filme de terror. O título se refere à trama dos tecidos, e as assombrações são aquelas vindas dos nossos próprios medos e traumas. Então, que fique bem claro: “Trama Fantasma” é um ótimo filme. Mas cujo título pode confundir um público menos informado.

Com roteiro e direção do sempre cifrado e simbólico Paul Thomas Anderson (de “Magnólia” e “Sangue Negro”), “Trama Fantasma” enfoca a vida do (fictício) estilista Reynolds Woodcock (Daniel Day-Lewis, soberbo), um homem tão bem sucedido profissionalmente quanto problemático pessoalmente. Acostumado a desenhar e confeccionar os mais refinados guarda-roupas para as mais altas camadas da sociedade, Reynolds comanda uma eficientíssima equipe que concretiza suas criações, mas se vê incapaz de manter um relacionamento amoroso minimamente satisfatório. Só para contextualizar, ele escolhe suas esposas pelas medidas delas…

O filme é uma belíssima parábola sobre as máscaras que cada um de nós escolhe para encarar a vida, mas que depois ficam impossíveis de serem removidas. Não raramente, mergulhamos tão profundamente nos personagens que construímos para escamotear esta ou aquela situação, que quando menos percebemos nos transformamos na própria fantasia que idealizamos. Ou quando nunca percebemos. O real desaparece. Mas o que é real e o que é construção nas sociedades cada vez mais pautadas pelas aparências? Assim, abrem-se os espaços para a loucura, para o imponderável e o inacreditável. Com os limites entre o humano e o selvagem tornando-se cada vez mais tênues.

Para falar sobre aparências, Anderson criou um mundo cinematográfico imaculadamente perfeito. Cada frame, cada segundo, cada movimento, cada enquadramento, cada luz, cada imagem vem carregadas de uma mimetização tão idealizada da perfeição que dá pena até de piscar durante o filme, para que nada seja perdido. Não devem existir sequer banheiros no mundo de Woodcock (nome que por si só já seria uma ironia, pois pode ser livremente traduzido como “pênis de madeira”).

Para embalar este mundo perfeito for fora e enlouquecido por dentro, Anderson contou com a excelente trilha sonora de seu colaborador habitual Johnny Greenwod, que cria aqui um universo sonoro que flerta abertamente com os antigos eruditos, sem abrir mão da contemporaneidade. E a belíssima fotografia foi executada (ainda que não creditada) pelo próprio diretor.

Ao escolher um cinema para ver “Trama Fantasma”, certifique-se antes da atual condição técnica da sala. Seria uma pena desperdiçar um dos mais belos visuais dos últimos anos em alguns destes vários cinemas que temos em nosso circuito exibidor que teimam em postergar a manutenção dos projetores, deixando os filmes escuros e sem brilho.

A estreia é nesta quinta, 22 de fevereiro.