O ENCANTADOR “UM OUTRO FRANCISCO” CRUZA OLHARES E PERCEPÇÕES ATRAVÉS DA BELEZA DAS ARTES.

Por Celso Sabadin.

Costumo dizer, meio brincando (pero no mucho), que nem todo documentário realmente documenta. Existem documentários, realizados de maneira mais poética que preferem instigar e encantar que propriamente documentar. Particularmente, gosto tanto dos bons documentários que documentam como dos que encantam.

“Um Outro Francisco” – que estreia em cinemas nesta quinta-feira, 15/05 – consegue a difícil proeza de documentar e encantar ao mesmo tempo. Com muita qualidade e intensidade. Isto porque ele tece uma refinada rede de narrativas que provocam no espectador tanto a curiosidade concreta a respeito da investigação do olhar estrangeiro sobre a cultura brasileira, quanto a poesia abstrata da arte fotográfica que é utilizada como veículo desta investigação.

Explicando melhor. Com roteiro e direção da cubana radicada no Brasil Margarita Hernández, “Um Outro Francisco” mostra dois fotógrafos profissionais italianos – Dario de Dominicis e Giorgio Negro – que viajam ao interior do Ceará para realizar um ensaio fotográfico. A ideia é registrar a Festa de São Francisco em Canindé, considerada uma das maiores manifestações religiosas brasileiras. Já temos aí um documentário dentro do outro, sendo um fotográfico, dos italianos, e o outro audiovisual, o que estamos assistindo.

Mesmo o mergulho dos europeus sobre a festa cearense se dá em dois diferentes níveis, posto que Giorgio já mora há algum tempo no Brasil, enquanto Dario, não: são duas percepções.

O choque entre as culturas explode no filme com uma riqueza raramente registrada. Em Canindé, Dario e Giorgio destilam com suas fotos um inédito olhar estrangeiro sobre o evento, ao mesmo tempo em que travam contato com as fotos e os fotógrafos já há anos estabelecidos no lugar, trocando experiências e pontos de vistas.

Não bastasse este cativante intercâmbio artístico, a dupla também solicita aos romeiros e moradores locais que expressem suas opiniões sobre o material visual por eles registrado, gerando assim momentos das mais astutas e arrebatadoras espontaneidades genuínas típicas da nossa terra.

Do lado “de cá” da tela, eu mesmo, enquanto plateia, me percebo com um olhar duplamente estrangeiro, na medida em que desconheço (ou desconhecia, antes de ver o filme) tanto os fotógrafos italianos quanto a festa cearense. Ou seja, enquanto mergulho nestes universos investigados pelo longa, também me encanto com todas as belezas que desfilam na tela, sejam elas as fantásticas fotos em preto e branco de Dario, a explosão de cores de Canindé (magnificamente captada por Rogério Resende), a imponência naif das estátuas e templos religiosos, a fé e a sabedoria popular dos locais, enfim, a própria obra audiovisual como um todo.

Valhei-me São Francisco! O que mais eu posso esperar de um filme?

“Um Outro Francisco” chega aos cinemas em 15 de maio no Dragão do Mar, em Fortaleza, e com exclusividade nos cinemas da rede CineSystem no Rio de Janeiro e São Paulo.