“O FIM E OS MEIOS” RETRATA A SUJEIRA DOS JOGOS DO PODER.

Por Celso Sabadin.

Tentar entender o país através dos relacionamentos humanos. Foi esta a proposta que o roteirista e diretor Murilo Salles abraçou em “O Fim e os Meios”, longa que competiu em Gramado este ano. Veterano deste festival, onde já apresentou os premiados “Nunca Fomos Tão Felizes”, “Faca de Dois Gumes” e “Como Nascem os Anjos”, entre outros, Salles afirmou na apresentação do seu trabalho que todos os seus filmes são políticos, mas este é explicitamente sobre política.

E se o assunto é política, nada como ambientar a trama em Brasília. É para lá que se muda o casal Paulo Henrique (Pedro Brício) e Cris (Cintia Rosa), ele, um jovem publicitário ainda ingênuo que acredita ser possível fazer marketing político com dignidade, e ela uma jornalista profissional e pragmática. Após um tumultuado início de vida a dois no Rio de Janeiro, ambos vão tentar um recomeço na capital federal. É ali que os protagonistas se infectam com o que há de pior da alma humana, envolvendo-se em traições, grandes somas de dinheiro, maracutaias e negociatas. O jogo político é mostrado como uma armadilha sem escapatória, um monstro devorador de caráteres que passa como um rolo compressor sobre qualquer eventual boa intenção, um câncer – simbólico e literal – que consome a tudo e a todos com inigualável voracidade, um mal fundamentado nas mais sólidas raízes históricas. E quem poderá dizer que não é assim?

“O Fim e os Meios” passa o seu triste e real recado sem panfletarismo e com interessantes provocações estéticas. Desde uma criativa e extremamente perturbadora trilha sonora, até enquadramentos de câmera que explicitam a pequenez de cada indivíduo diante da típica arquitetura-ostentação-repressiva brasiliense.

Nada, porém, é mais forte nesta representação da angústia que o olhar vazio do Senador interpretado por Emiliano Queirós. Nas poucas cenas em que aparece, este grande ator nos brinda com a síntese do jogo do poder, exibindo em sua própria face e postura corporal o peso da derrota de quem venceu a vida inteira semeando discórdia. É a própria representação da corrosão política, um vampiro de almas em final de carreira que acaba vampirizando a si próprio e a todos que o rodeiam.